Ministro Barroso propõe remição como forma de indenizar presos em condições degradantes
Ao invés de indenizar, por meio de reparação pecuniária, presos que sofrem danos morais por cumprirem pena em presídios com condições degradantes, o ministro Luís Roberto Barroso propôs a remição de dias da pena, quando for cabível a indenização. A proposta foi apresentada na sessão plenária do Supremo Tribunal Federal (STF) desta quarta-feira (6), no voto proferido pelo ministro no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 580252, com repercussão geral, em que se discute a responsabilidade civil do Estado por danos morais decorrentes de superlotação carcerária. Após o voto do ministro Barroso, o julgamento foi interrompido por um pedido de vista da ministra Rosa Weber.
O julgamento teve início em dezembro de 2014, ocasião em que o relator, ministro Teori Zavascki, votou no sentido de dar procedência ao pedido, por considerar que o Estado tem responsabilidade civil ao deixar de garantir as condições mínimas de cumprimento das penas nos estabelecimentos prisionais. Para o relator, é dever do estado oferecer aos presos condições carcerárias de acordo com padrões mínimos de humanidade estabelecidos em lei, bem como, se for o caso, ressarcir os danos causados que daí decorrerem. O voto do relator foi acompanhado pelo ministro Gilmar Mendes.
Responsabilidade civil
O ministro Barroso concordou com o voto do relator quanto à responsabilização civil do estado e o dever de indenizar. A Constituição Federal de 1988 assegura a indenização por danos morais em razão de violação de direitos fundamentais. Para tanto, é preciso saber se há o dano, a culpa e nexo causal. No caso, a existência de danos morais por violação à dignidade da pessoa humana é inequívoca, frisou o ministro. Ninguém discute que o Estado tem, sim, responsabilidade objetiva civil pelas péssimas condições dos presídios. A culpa e o nexo causal também estão claras para o ministro Barroso, o que gera o dever reparar os danos causados aos presos submetidos a essas condições.
Mas, ao invés de aderir ao pagamento da indenização em pecúnia, o ministro apresentou proposta alternativa de pagamento, reparando o dano por meio da remição de dias de pena cumpridos em condições degradantes, aplicando, por analogia, o artigo 126 da Lei de Execução Penal.
Direito comparado
Ao propor essa forma alternativa de reparação do dano moral sofrido, o ministro explicou que o pagamento de indenizações pecuniárias não resolve o problema nem do indivíduo nem do sistema, podendo mesmo agregar complicações, já que não foram estabelecidos quaisquer critérios. Além disso, eventual decisão do STF confirmando a possiblidade de indenização pecuniária abriria outro flanco grave: a deflagração de centenas de milhares de ações em diferentes estados do Brasil, de presos requerendo indenizações.
O ministro citou a Itália como exemplo de país que adotou soluções alternativas para o problema da superpopulação carcerária. Lá, segundo Roberto Barroso, foi implantada uma solução sistêmica, que previu a adoção de medidas cautelares alternativas diversas da prisão, a prisão domiciliar para crimes de menor potencial ofensivo e a monitoração eletrônica, entre outros. E, também, a possiblidade de remição de um dia de pena para cada dez dias de detenção em condições degradantes ou desumanas.
Critérios
Pela proposta do ministro, os danos morais causados a presos por superlotação ou condições degradantes devem ser reparados, preferencialmente, pela remição de parte do tempo da pena – à razão de um dia de remição para cada 3 a 7 dias cumpridos sob essas condições adversas, a critério do juiz da Vara de Execuções Penais competente. Para o ministro, é legítimo computar o tempo de prisão sob condições degradantes com mais valia, usando a técnica da remição.
Com a solução, diz o ministro, ganha o preso, que reduz o tempo de prisão, e ganha o Estado, que se desobriga de despender recursos com indenizações, dinheiro que pode ser, inclusive, usado na melhoria do sistema.
No caso de o preso já ter cumprido integralmente sua pena, não havendo como aplicar a remição, o ministro disse que é possível, então, o ajuizamento de ação civil para requerer indenização por danos morais, em forma de pecúnia.
Repercussão geral
Ao concluir seu voto, o ministro Barroso propôs uma tese de repercussão geral a ser analisada no caso:
“O Estado é civilmente responsável pelos danos, inclusive morais, comprovadamente causados aos presos em decorrência de violações à sua dignidade, provocadas pela superlotação prisional e pelo encarceramento em condições desumanas ou degradantes. Em razão da natureza estrutural e sistêmica das disfunções verificadas no sistema prisional, a reparação dos danos morais deve ser efetivada preferencialmente por meio não pecuniário, consistente na remição de 1 dia de pena por cada 3 a 7 dias de pena cumprida em condições atentatórias à dignidade humana, a ser postulada perante o Juízo da Execução Penal. Subsidiariamente, caso o detento já tenha cumprido integralmente a pena ou não seja possível aplicar-lhe a remição, a ação para ressarcimento dos danos morais será fixada em pecúnia pelo juízo cível competente”.
- Leia a íntegra do voto-vista do ministro Luís Roberto Barroso.
MB/FB
Processos relacionados: RE 580252
34 Comentários
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A proposta esquece um ponto básico (é inconstitucional por ferir a dignidade humana)
E, de tão boa, poderá ser aproveitada de forma indiscriminada (repercussão geral).
Mas o que importa é que os governantes, finalmente, poderão dormir em paz, a pensar que não precisam mais se preocupar em tratar os presos com dignidade. Afinal, os presos ganharão com o tratamento desumano!
Tudo se resumirá na lógica de que quanto maior o sofrimento, maior a remição (verdadeiro incentivo ao tratamento desumano)... continuar lendo
Boa sacada Francisco Luiz Macedo Jr., perfeita a sua lógica. continuar lendo
Interessante que não se fale em indenização dos danos morais para as crianças em escolas sucateadas, para doentes nos corredores dos hospitais, para as vítimas da violência.
Não acho que deva haver desrespeito a condições mínimas nos presídios, mas deveria se ter uma escala de prioridades, e somente após todos aqueles danos exemplificados acima terem sido indenizados ou reparados é que se deveria cogitar o ressarcimento a presidiário, o qual é, em primeira instância, por si só um causador de danos morais e materiais.
E a este, caberá ressarcir suas vítimas? continuar lendo
Sua resposta esta corretíssima, vivemos uma grande inversão de valores. continuar lendo
Bom texto, mas mostra que sempre estamos no caminho errado.
É uma medida paliativa e não gera nada de útil.
Assim, por essa medida, quanto mais incompetente o Estado, mais o bandido tem a diminuição de sua pena. Isso não vai resolver (nunca).
Bastava o ilustre Ministro considerar que se há dano a dignidade humana, não é o povo que tem que pagar (em dinheiro ou recebendo o bandido no colo mais cedo) e sim a figura dos responsáveis pela situação carcerária. O político.
Se numa empresa existem violações ou crime, os administradores tem que responder por eles. Porque no Governo não.
Já foi criada a responsabilidade fiscal (apesar das pedaladas). Porque não se cria a responsabilidade administrativa ou prisional, educacional, etc. O sujeito (político) quer seu salário, porque não responde por ele como teórico administrador??? continuar lendo
E o direito de quem morre no corredor dos hospitais da vitima do bandido como fica direito tem que ser igual para todos, direito e deveres neste pais só vê inversão de valores impunidade, quando isso vai mudar. continuar lendo
Abel,
Muda quando o político for responsabilizado pela má gerência.
Assim, se isso ocorrer no futuro, ser político será como ser Síndico de Condomínio, vai ser difícil achar um que queira se candidatar. continuar lendo
O que o Ministro Barroso propõe para as famílias das vítimas assassinadas, estupradas, violentadas, sequestradas e mortas?
O que o Ministro Barroso propõe para que o Estado Brasileiro empregue toda a arrecadação do Fundo Penitenciário para na construção de presídios dignos - não se quer hotel de 3 estrelas - mas que não afronte o preso nem às famílias das vítimas?
É importante que não se esqueça que "direito humano" tem de ser via de mão dupla! continuar lendo