25 de Junho de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Processo
Órgão Julgador
Partes
Publicação
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
Supremo Tribunal Federal
DecisãosobreRepercussãoGeral
Inteiro Teor do Acórdão - Página 1 de 12
21/02/2019 PLENÁRIO
REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 666.094 DISTRITO FEDERAL
RELATOR : MIN. ROBERTO BARROSO
RECTE.(S) : DISTRITO FEDERAL
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO DISTRITO FEDERAL
RECDO.(A/S) : UNIMED BRASILIA COOPERATIVA DE TRABALHO
MÉDICO
ADV.(A/S) : ACI HELI COUTINHO
AM. CURIAE. : UNIMED DO BRASIL - CONFEDERAÇÃO
NACIONAL DAS COOPERATIVAS MÉDICAS
ADV.(A/S) : MARCIA APARECIDA MENDES MAFFRA ROCHA
ADV.(A/S) : RAPHAEL CARVALHO DE OLIVEIRA
AM. CURIAE. : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE - CNS
ADV.(A/S) : MARCOS VINÍCIUS BARROS OTTONI
DIREITO CONSTITUCIONAL E SANITÁRIO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. RESSARCIMENTO DE UNIDADE PRIVADA DE SAÚDE. TABELA SUS. REPERCUSSÃO GERAL.
1. A decisão recorrida condenou o Distrito Federal a pagar a estabelecimento privado de saúde o valor referente a serviços prestados em cumprimento de ordem judicial.
2. Constitui questão constitucional relevante definir se a imposição de pagamento pelo Poder Público de preço arbitrado pela unidade hospitalar viola o regime de contratação pública da rede complementar de saúde (art. 199, §§ 1º e 2º, da CF/1988), ou se o ressarcimento com base em preço tabelado pelo SUS ofende princípios da ordem econômica.
3. Repercussão geral reconhecida.
Decisão: O Tribunal, por maioria, reputou constitucional a questão, vencido o Ministro Edson Fachin. Não se manifestou a Ministra Cármen Lúcia. O Tribunal, por maioria, reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, vencido o Ministro Edson Fachin. Não se manifestou a Ministra Cármen Lúcia.
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RE 666094 RG / DF
Ministro ROBERTO BARROSO
Relator
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REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 666.094 DISTRITO FEDERAL
O Senhor Ministro Luís Roberto Barroso (relator):
Ementa: Direito constitucional e sanitário. Recurso extraordinário. Ressarcimento de unidade privada de saúde. Tabela SUS. Repercussão geral.
1. A decisão recorrida condenou o Distrito Federal a pagar a estabelecimento privado de saúde o valor referente a serviços prestados em cumprimento de ordem judicial.
2. Constitui questão constitucional relevante definir se a imposição de pagamento pelo Poder Público de preço arbitrado pela unidade hospitalar viola o regime de contratação pública da rede complementar de saúde (art. 199, §§ 1º e 2º, da CF/1988), ou se o ressarcimento com base em preço tabelado pelo SUS ofende princípios da ordem econômica.
3. Repercussão geral reconhecida.
1. Trata-se de recurso extraordinário interposto
pelo Distrito Federal contra acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que condenou o ente federativo a pagar por serviços de saúde prestados por estabelecimento privado em cumprimento de ordem judicial, pelo preço arbitrado pela unidade hospitalar. Confira-se a ementa do acórdão recorrido:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA. DIREITO À SAÚDE. DEVER DO ESTADO. REDE PÚBLICA DE SAÚDE. INEXISTÊNCIA DE VAGA EM UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA. DECISÃO JUDICIAL DETERMINANDO A INTERNAÇÃO E O TRATAMENTO EM HOSPITAL PARTICULAR. DESPESAS MÉDICAS DE RESPONSABILIDADE DO ENTE FEDERATIVO. REEMBOLSO. VALORES PRATICADOS NO MERCADO.
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RE 666094 RG / DF
1. Não há se falar em inépcia da inicial se, da narração dos fatos, decorre de forma lógica o pedido. Ora, se inexistia vaga em UTI na rede pública de saúde e se essa falta foi compensada mediante a internação do paciente em hospital pertencente à parte demandante, que custeou, por certo período de tempo, o tratamento da pessoa enferma, é legítimo que a Autora postule o ressarcimento das despesas médicas ao ente que tem a obrigação constitucional de efetivar o direito à saúde.
2. A resistência oferecida pelo Distrito Federal no presente feito e a inocorrência de pagamento voluntário evidenciam a necessidade do processo judicial para a efetivação do direito substancial deduzido em juízo. Patente, pois, o interesse processual da Autora.
3. Na linha do que dispõe o art. 196 da Constituição da Republica, é dever do Estado efetivar o direito à saúde, não ficando ele desobrigado dessa sua tarefa constitucional na hipótese de inexistir vaga em unidade de terapia intensiva nos hospitais da rede pública de saúde, quando, então, o ente público deverá arcar com o ônus da internação do paciente em hospital particular.
4. Os valores a serem pagos pelo Distrito Federal não devem sofrer limitação da Tabela do SUS, notadamente quando a instituição privada que prestou o serviço não firmou qualquer contrato ou convênio com o ente federativo.
5. A Lei n. 11.960, de 29 de junho de 2009, em razão do seu caráter instrumental e material, não alcança as ações propostas antes da sua entrada em vigor, como a presente, ajuizada em 18.09.2008. Precedentes do STJ.
6. Reexame necessário e recurso do Distrito Federal
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não providos. Apelo da autora provido para majorar a condenação do ente federativo, bem como para afastar a aplicação da Lei n. 11.960/2009 ao caso.
2. Na origem, a recorrida Unimed Brasília
Cooperativa de Trabalho Médico ajuizou ação de cobrança, objetivando a condenação do Distrito Federal a pagar pelos serviços médicos que, por ordem judicial, prestou em favor de paciente que não conseguiu vaga em unidade do Sistema Único de Saúde SUS.
3. O Distrito Federal, com fundamento no artigo
102, III, alínea a, da Constituição Federal, pretende a reforma do acórdão, para que as despesas médicas cobradas pelo estabelecimento privado sejam pagas de acordo com os parâmetros e valores estabelecidos pelo SUS para remuneração da rede complementar de saúde (unidades privadas credenciadas para atendimento público). O recorrente sustenta que a imposição de pagamento com base no preço arbitrado pela prestadora privada violaria os arts. 5º, caput, 196 e 199, § 1º, da Constituição, sob o argumento de que não estaria obrigado a reembolsar despesas médicas efetuadas por paciente internado em hospital particular por força de ordem judicial com base nos valores de mercado, mas de acordo com a Tabela SUS, tal como ocorreria com as instituições privadas conveniadas ou contratadas pelo Estado. Indica que: (i) pagar a uma instituição que presta serviço ao Estado preço diverso daquele que é usualmente pago para a mesma atividade viola o princípio da isonomia; e (ii) a Constituição impõe um regime específico de contratação e remuneração da rede complementar de Saúde.
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4. A Procuradoria Geral da República opinou pelo
desprovimento do recurso. Afirmou que:
A leitura do art. 199, § 1º, da CF, não conduz à conclusão esperada pelo recurso. O preceito não autoriza que se possa equiparar a determinação judicial dirigida a um hospital particular a fim de que atenda determinado paciente à participação, complementar e facultativa, de instituições privadas no sistema único de saúde, caso este que pressupõe contrato de direito público ou convênio, em que a autonomia da vontade do particular exerce importância decisiva para a celebração do pacto.
5. A Presidência do Tribunal de Justiça do
Distrito Federal e dos Territórios admitiu o recurso.
6. É o relatório. Passo à manifestação.
7. O recurso extraordinário deve ser conhecido.
Como constatado pelo Tribunal de origem, a questão relacionada ao pagamento de serviços de saúde prestados por ordem judicial, em razão de anterior frustação de atendimento na rede pública, foi expressamente enfrentada pelo acórdão recorrido. Além disso, a controvérsia diz respeito à interpretação de dispositivos da Constituição, não sendo necessário o exame de legislação infraconstitucional. Não é preciso, ainda, reexaminar fatos e provas, tendo em vista que não está em discussão se os serviços foram ou não prestados pelo estabelecimento privado. A questão constitucional em exame se restringe a saber se o art. 199 da Constituição impõe ao Estado um
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regime de contratação de prestadores privados de saúde, que deve ser observado inclusive quando a prestação do serviço privado decorrer de decisão judicial fundada no direito social à saúde.
8. O acórdão recorrido afirmou que o art. 196 da
Constituição da Republica impõe ao Estado o dever de efetivar o direito à saúde, não ficando ele desobrigado dessa sua tarefa constitucional na hipótese de inexistir vaga em unidade de terapia intensiva nos hospitais da rede pública de saúde, quando, então, o ente público deverá arcar com o ônus da internação do paciente em hospital particular. Nessa hipótese, no entanto, concluiu que seria inadequado limitar o ressarcimento do prestador privado à Tabela SUS, uma vez que a instituição privada que prestou o serviço não firmou qualquer contrato ou convênio com o ente federativo.
9. A questão trazida neste recurso extraordinário coloca, de um lado, o regime constitucional de contratação da rede complementar de saúde pública e, de outro lado, princípios da ordem econômica como a livre iniciativa e a propriedade privada. É certo que a Constituição dispõe que a assistência à saúde é livre à iniciativa privada (art. 199 caput). E é igualmente certo que as instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste (art. 199, § 1º), sendo vedada a destinação de recursos públicos para auxílios ou subvenções às instituições privadas com fins lucrativos. Há, portanto, na Constituição um conjunto de regras que: (i) condicionam o atendimento público de saúde por prestadores privados à
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observância das diretrizes do SUS, o que inclui os parâmetros e critérios de financiamento da rede pública e privada; e (ii) vedam o emprego de recursos públicos para o auxílio de estabelecimentos privados. Diante disso, o pagamento do preço apurado unilateralmente pelo prestador privado, que inclui margem de lucro, contrariaria esse regime constitucional de contratação.
10. No entanto, a imposição de ressarcimento pelos valores e critérios determinados pelo Sistema Público de Saúde, a um agente que foi compelido a suprir uma falha de atendimento do Poder Público, mitiga a livre iniciativa (art. 170 caput da CF/1988), podendo ser equiparada à expropriação de bens em violação à garantia da propriedade privada (arts. 5º, XXII e 170, II, da CF/1988).
11. Assim sendo, a identificação de solução para o conflito potencial entre o regime de contratação da rede complementar de saúde pública e as garantias da livre iniciativa e da propriedade privada, nos casos de serviço de saúde prestado por ordem judicial, é matéria de evidente repercussão geral, sob todos os pontos de vista (econômico, político, social e jurídico), em razão da relevância e transcendência dos direitos envolvidos.
12. Diante do exposto, manifesto-me no sentido de reconhecer a repercussão geral da seguinte questão constitucional: saber se a imposição de pagamento pelo Poder Público de preço arbitrado pela unidade hospitalar, para ressarcir serviços de saúde prestados por força de decisão judicial, viola o regime de
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contratação da rede complementar de saúde pública (art. 199, §§ 1º e 2º, da CF/1988).
13. É a manifestação.
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REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 666.094 DISTRITO FEDERAL
PRONUNCIAMENTO
SAÚDE – CUSTEIO – INTERNAÇÃO HOSPITALAR – PARTICULAR – RESSARCIMENTO – ADMISSÃO NA
ORIGEM – RECURSO
EXTRAORDINÁRIO – REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA.
1. O assessor Dr. David Laerte Vieira prestou as seguintes informações:
Eis a síntese do discutido no recurso extraordinário nº 666.094, relator o ministro Luís Roberto Barroso, inserido no sistema eletrônico da repercussão geral em 1º de fevereiro de 2019, sexta-feira, sendo o último dia para manifestação 21 de fevereiro, quinta-feira. As peças foram digitalizadas em 4 de fevereiro de 2019.
O Distrito Federal interpôs recurso extraordinário, com alegado fundamento na alínea a do permissivo constitucional, contra acórdão mediante o qual a Primeira Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios negou provimento ao reexame necessário e à apelação do Distrito Federal, mantendo o entendimento do Juízo no sentido do dever do Estado efetivar o acesso à saúde, não sendo escusa a inexistência de vaga em unidade de terapia intensiva na rede pública, situação na qual caberá o custeio da internação em hospital particular, e proveu o apelo da UNIMED Brasília Cooperativa de Trabalho Médico, a majorar a condenação do ente federativo no tocante ao ressarcimento pelos serviços prestados, de valores limitados à Tabela do
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Sistema Único de Saúde – SUS, para aqueles efetivamente praticados no mercado.
Preliminarmente, sustenta a admissibilidade do recurso, ante o preenchimento dos requisitos indispensáveis ao trânsito. Assinala transgressão aos artigos 5º, cabeça, 196 e 199, § 1º, da Constituição Federal. No mérito, firma o dever de o ente público promover o ressarcimento, observados os valores da Tabela do SUS, por suficiente a cobrir custos operacionais – destacando um sem-número de hospitais conveniados a operar em conseguimento de balanços contábeis positivos – pena de se violar o princípio da isonomia, vis-à-vis o tratamento diferenciado entre o recorrido e as demais instituições credenciadas pela execução de equivalente serviço. Afirma ter a determinação judicial substituído o convênio ou contrato de direito público previsto no § 1º do artigo 199 do Diploma Maior – a prestação pelo particular, no caso, compreender-se-ia abarcada pelo conceito de participação de forma complementar do serviço de saúde pública.
Sob o ângulo da repercussão geral, assevera ultrapassar o tema os limites subjetivos da lide, mostrando-se relevante dos pontos de vista jurídico, político e econômico.
O extraordinário foi admitido na origem.
O Relator submeteu o processo ao denominado Plenário Virtual, manifestando-se pela existência de repercussão geral da controvérsia, sob os pontos de vista econômico, político, social e jurídico. Apontou necessária a definição sobre se a imposição de pagamento pelo Poder Público de preço arbitrado por unidade hospitalar privada, a ressarcir serviços executados por força de decisão judicial, ofende o regime de contratação da rede complementar de saúde pública disposto no artigo 199, parágrafos 1º e 2º, da Lei Maior ou, inversamente, se o ressarcimento com base em preço tabelado pelo SUS ofende
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princípios da ordem econômica. Ressaltou a importância da identificação de solução para o conflito potencial envolvendo o mencionado regime de contratação da rede complementar de saúde pública e as garantias da livre iniciativa e da propriedade privada.
2. Tem-se tema a exigir a pacificação da jurisprudência pronunciando-se o Supremo sobre a possibilidade de haver o reembolso de despesas médicas considerado o preço apontado por pessoa jurídica de direito privado.
3. Admito configurada a repercussão geral.
4. À Assessoria, para acompanhar a tramitação do incidente.
5. Publiquem.
Brasília – residência –, 6 de fevereiro de 2019, às 20h20.
Ministro MARCO AURÉLIO
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