28 de Junho de 2022
- 2º Grau
Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro
Detalhes da Jurisprudência
Órgão Julgador
Julgamento
Relator
Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro
Inteiro Teor
Supremo Tribunal Federal
EmentaeAcórdão
Inteiro Teor do Acórdão - Página 1 de 56 1749
08/08/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
RELATOR : MIN. EDSON FACHIN
AGTE.(S) : EDUARDO HENRIQUE DA FONTE DE
ALBUQUERQUE SILVA
ADV.(A/S) : HAMILTON CARVALHIDO E OUTRO (S) E
OUTRO (A/S)
ADV.(A/S) : RAFAEL DE ALENCAR ARARIPE CARNEIRO E
OUTRO (A/S)
AGDO.(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
PROCESSO PENAL. FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO.
RITO DA LEI 8.038/90. DILAÇÃO PROBATÓRIA EM FASE
POSTULATÓRIA. INADIMISSIBILIDADE.
1. Conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a escolha
do momento de oferecer a denúncia é prerrogativa do Ministério Público,
a quem incumbe sopesar se os elementos indiciários já colhidos são
suficientes para a configuração da justa causa necessária ao recebimento
da denúncia.
2. Caso os elementos indiciários sejam insuficientes para conferir um
lastro probatório mínimo, capaz de dar plausibilidade aos fatos
articulados na denúncia, ao Poder Judiciário cabe rejeitar a denúncia por
falta de justa causa.
3. No rito estabelecido para o processo penal de competência
originária dos Tribunais, em razão de foro por prerrogativa de função,
apresentada a denúncia e a resposta prevista no art. 4º da Lei 8.038/90,
não pode o Ministério Público reforçar os elementos de convicção,
produzindo mais provas antes de proferido o juízo de admissibilidade da
denúncia.
4. Às partes não é dado produzir provas nas fases postulatórias. No
rito da Lei 8.038/90, entre o oferecimento da denúncia e o juízo de
admissibilidade a ser proferido pelo Tribunal, não há espaço para
dilações probatórias tais como diligências, oitivas e perícias. O pedido de
Supremo Tribunal Federal
EmentaeAcórdão
Inteiro Teor do Acórdão - Página 2 de 56 1750
INQ 3998 AGR / DF
juntada de documentos é permitido (art. 231, do CPP), cabendo ao relator
indeferir a providência, caso tenha caráter irrelevante, impertinente,
protelatório ou tumultuário, nos termos do art. 400, § 1º, do CPP.
5. Agravo regimental improcedente.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da
Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do
Senhor Ministro Edson Fachin, na conformidade da ata de julgamento e
das notas taquigráficas, por maioria, negar provimento ao agravo
regimental, permitindo a continuidade do julgamento, nos termos do
voto do Relator, vencidos os Ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes.
Brasília, 8 de agosto de 2017.
Ministro EDSON FACHIN
Relator
2
Supremo Tribunal Federal
Relatório
Inteiro Teor do Acórdão - Página 3 de 56 1751
04/04/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
RELATOR : MIN. EDSON FACHIN
AGTE.(S) : EDUARDO HENRIQUE DA FONTE DE
ALBUQUERQUE SILVA
ADV.(A/S) : HAMILTON CARVALHIDO E OUTRO (S) E
OUTRO (A/S)
ADV.(A/S) : RAFAEL DE ALENCAR ARARIPE CARNEIRO E
OUTRO (A/S)
AGDO.(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
Relatório
O Senhor Ministro Edson Fachin (Relator) : Às fls. 1684-1585, o
denunciado Eduardo Henrique da Fonte de Albuquerque Silva
peticionou ao eminente Ministro Dias Toffoli, afirmando revelar “o
acompanhamento processual do feito em referência, a juntada aos autos, quando
já encontravam-se os autos com Vossa Excelência, de petição formulada pelo
Senhor Procurador-Geral da República, prestando informações e trazendo
documentos”.
Sustentou, ainda, que “o Requerente não tem ciência, nem sobre eles pode
manifestar-se, porque não publicada e trazida aos autos depois da sustentação das
partes na sessão do dia 21 de novembro de 2016, destinada a admissão ou não da
ação penal, julgamento esse suspenso pelo pedido de vista de Vossa Excelência,
após o voto do eminente Relator”.
Concluiu, requerendo, “diante da necessidade absoluta da ciência e
pronunciamento do Requerente acerca da prova trazida aos autos, em meio do
julgamento do recebimento ou não da denúncia e potencialmente capaz de influir
na sua decisão, vista dos autos e prazo para manifestação, assegurando-se, assim,
o pleno exercício do direito de defesa”.
O eminente Ministro Dias Toffoli, às fls. 1715-1717, determinou a
remessa dos autos a este Gabinete para deliberar sobre os requerimentos.
Supremo Tribunal Federal
Relatório
Inteiro Teor do Acórdão - Página 4 de 56 1752
INQ 3998 AGR / DF
Às fls. 1720-1722 decidi, sem grifos no original:
Sem adentrar, neste momento, na análise da alegada
indispensabilidade ou não da providência pretendida pela
defesa, em face da juntada de documentos pelo Ministério
Público após iniciado o julgamento sobre o recebimento ou
rejeição da denúncia, importa considerar que na fase processual
que intermedeia o oferecimento da denúncia e a decisão sobre
seu recebimento ou rejeição não há previsão legal de dilação
probatória.
o oferecer a denúncia, o Ministério Público formula sua
opinio delicti e a apresenta ao Poder Judiciário para controle,
cabendo a este último acatar a acusação instaurando o processo
penal ou rejeitar a denúncia.
É ônus da acusação, portanto, assegurar-se de que a
denúncia está embasada em elementos probatórios capazes de
configurar indícios de materialidade e autoria delitivas
suficientes à configuração da justa causa. À míngua desses
elementos, impor-se-á a rejeição da denúncia, o que não impede
a propositura de nova denúncia, desta feita melhor embasada
em provas.
Por não haver previsão legal, nem mesmo espaço para
produção probatória nesta fase processual, máxime quando
iniciado o julgamento, não pode o Ministério Público, a não
ser que o faça a título de aditamento da denúncia, reforçar o
arcabouço probatório, principalmente depois que a defesa já
apresentou sua resposta.
Sendo assim, determino o desentranhamento da petição
e documentos das fls. 1637-1669, devolvendo-a ao Ministério
Público Federal, sem prejuízo de ulterior juntada no curso de
eventual processo penal a ser instaurado quando de sua fase
probatória ou, caso rejeitada a denúncia por falta de justa
causa, quando do eventual oferecimento de uma nova
denúncia .
Resta, assim, prejudicado o pedido da defesa das fls.
1684-1685.
2
Supremo Tribunal Federal
Relatório
Inteiro Teor do Acórdão - Página 5 de 56 1753
INQ 3998 AGR / DF
Diante da decisão, o denunciado interpôs agravo regimental
argumentando, em síntese, que: (i) a falta de previsão legal ou de espaço para
produção probatória na fase processual em que se acha o feito, principalmente
porque iniciado o seu julgamento, invocados no decisum recorrido como
motivação, não encontra, data venia, eco no sistema processual penal brasileiro,
forte na garantia constitucional da ampla defesa e na observância dos princípios
processuais da verdade material, da aquisição da prova e da obrigatoriedade de
sua valoração jurisdicional; (ii) “os meios de prova produzidos na fase
inquisitorial pertencem ao inquérito, mesmo que possam ser valorados em
desfavor da parte que os produziu, não havendo como excluí-los do julgamento de
recebimento ou não da denúncia”; (iii) o denunciado tem o direito de
conhecer integralmente o teor da prova, sobre ela se manifestar antes do
prosseguimento do julgamento “... até porque já foi disponibilizada nos autos
os julgadores, nele se encontra juntada e sobretudo porque certifica, de forma
peremptória a inocência do imputado...”; (iv) não restou apreciado o pedido
da defesa, relativo à divergência entre o voto do relator e a certidão do
resultado parcial do julgamento.
É o relatório.
3
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.EDSONFACHIN
Inteiro Teor do Acórdão - Página 6 de 56 1754
04/04/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
VOTO
O Senhor Ministro Edson Fachin (Relator): Segundo dispõe o art.
317 do RISTF, sem grifos no original, “ressalvadas as exceções previstas neste
Regimento, caberá agravo regimental, no prazo de cinco dias de decisão do
Presidente do Tribunal, de Presidente de Turma ou do Relator, que causar
prejuízo ao direito da parte ”.
Como se vê da decisão agravada, não há prejuízo a direito da parte
agravante aferível no caso.
O denunciado, com razão, opôs-se à juntada, por parte do
Procurador-Geral da República, de documentos que reforçariam o juízo
de procedência quanto à instauração do processo penal, sem que lhe fosse
dada oportunidade de manifestar-se a respeito.
Sustentou, na oportunidade, que tomou ciência da juntada desses
documentos em razão da consulta ao acompanhamento processual e
afirmou que “... do teor de tais informações e documentos, o Requerente não
tem ciência, nem sobre eles pode manifestar-se, porque não publicada e trazida
os autos depois da sustentação das partes na sessão do dia 21 de novembro de
2016” (fls. 1.684).
Todavia, após a decisão agravada, que determinava o
desentranhamento dos documentos juntados em momento processual
inoportuno, o agravante sustentou a necessidade da manutenção da
prova documental produzida, pleiteado a concessão de prazo para sobre
ela manifestar-se “antes do prosseguimento do julgamento, até porque já foi
disponibilizada nos autos aos julgadores, nele se encontra juntada e sobretudo
porque certifica, de forma peremptória, a inocência do Imputado, desmentindo,
apontando, mais uma vez, de modo suficiente para a falta de justa causa para a
ação penal, senão para a absolvição do imputado” (fls. 1.732)
Em que pese na petição de agravo o acusado ter mudado a
concepção sobre o conteúdo dos documentos juntados pelo Ministério
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.EDSONFACHIN
Inteiro Teor do Acórdão - Página 7 de 56 1755
INQ 3998 AGR / DF
Público, os quais, depois de desentranhados, entende que favorecem os
interesses da defesa, enquanto que anteriormente alegava não ter tido
acesso a eles, de fato, não pode o Ministério Público, sem aditar a
denúncia, reforçar o conjunto probatório após ter o denunciado oferecido
sua resposta à acusação nos termos do art. 4º, da Lei 8.038/90.
No presente caso, ainda mais impertinente o momento processual,
eis que o Procurador-Geral da República apresentou documentos depois
de iniciado o julgamento, já tendo votado o eminente Relator, durante
período em que estavam os autos com vista ao Ministro Dias Toffoli.
Ainda que o agravante sustente ser necessária a manutenção dos
documentos juntados, com a abertura de prazo para que possa se
contrapor aos elementos trazidos pelo Procurador-Geral da República, a
providência pretendida implica, de fato, a inversão do rito, com a
realização de providências instrutórias, durante o julgamento em curso,
com prejuízo evidente ao valor constitucional da duração razoável do
processo, princípio inscrito no art. 5º, LXXVIII, da Constituição da
República.
Como ressaltado na decisão recorrida, ao oferecer a denúncia, o
Ministério Público formula sua opinio delicti e a apresenta ao Poder
Judiciário para controle, cabendo a este último acatar a acusação,
instaurando o processo penal, ou rejeitar a denúncia.
Esta Suprema Corte já decidiu, por sua composição plenária, que o
momento do oferecimento da denúncia é providência que se situa no
âmbito da prerrogativa do Ministério Público, o qual, todavia, arcará com
o ônus da rejeição da peça acusatória, por falta de justa causa, caso
proceda com açodamento e ofereça denúncia antes de dispor de
elementos probatórios suficientes à configuração dos necessários indícios
de autoria e materialidade.
Nesse sentido, destaco ementa que não leva grifos no
original:
SEGUNDA PRELIMINAR. CONSTATAÇÃO, PELO
MINISTÉRIO PÚBLICO, DA EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE
AUTORIA E MATERIALIDADE DE CRIMES.
OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. INVESTIGAÇÕES NÃO
2
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.EDSONFACHIN
Inteiro Teor do Acórdão - Página 8 de 56 1756
INQ 3998 AGR / DF
CONCLUÍDAS. ÓBICE INEXISTENTE. AUSÊNCIA DO
RELATÓRIO POLICIAL. PEÇA DISPENSÁVEL PARA EFEITO
DE OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. 1. Se o titular da ação
penal entende que há indícios mínimos de autoria e
materialidade dos fatos tidos como criminosos, ele pode
oferecer a denúncia antes de concluídas as investigações. A
escolha do momento de oferecer a denúncia é prerrogativa
sua. 2. O relatório policial, assim como o próprio inquérito que
ele arremata, não é peça indispensável para o oferecimento da
denúncia. ( Inq 2.245/MG, Rel. Joaquim Barbosa, Pleno, j.
28.08.2007).
Sendo assim, a prerrogativa de decidir qual o melhor
momento para a propositura da ação penal não exonera o Ministério
Público do ônus, no momento em que deduz a pretensão acusatória, de
embasar a denúncia em elementos probatórios capazes de configurar
indícios de materialidade e autoria delitivas suficientes à configuração da
justa causa.
Ainda, caso os elementos juntados com a acusação não se
apresentem hígidos, não só do ponto de vista da robustez probatória, mas
também do ponto de vista do comportamento processual do Ministério
Público, que eventualmente pode por em xeque o eficaz exercício do
direito de defesa por parte do acusado, o caminho natural é a rejeição da
denúncia. Nesse sentido tem decido esta Suprema Corte. Colaciono, à
guisa de exemplo, decisão proferida no Inq 2.560, Relatora Min. Rosa
Weber, julgado em 08.03.2016, de cuja ementa extraio o seguinte trecho,
que não leva grifos no original:
“PENAL. PROCESSUAL PENAL. CORRUPÇÃO ATIVA E
PASSIVA. DEPUTADO FEDERAL. DESMEMBRAMENTO
PARCIAL. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA.
CONTRADITÓRIO SUBDIMENSIONADO. INVALIDADE
DOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS. AUSÊNCIA DE JUSTA
CAUSA. DENÚNCIA REJEITADA. 1. Havendo detentores e
não detentores de prerrogativa de foro acusados na mesma
causa penal, a atual jurisprudência desta Suprema Corte aponta
3
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.EDSONFACHIN
Inteiro Teor do Acórdão - Página 9 de 56 1757
INQ 3998 AGR / DF
no sentido de proceder ao desmembramento como regra, salvo
se algum motivo excepcional recomendar o julgamento
conjunto. Desmembramento efetivado no caso concreto, com
ressalva do corréu relativamente ao qual imbricadas a tal ponto
as condutas que inviabilizada a cisão. 2. O regime de
interceptação telefônica obedece regra de direito estrito porque
constitui exceção constitucional ao direito à intimidade (art. 5º,
XII, da CF). Desrespeito às formas e sonegação, a esta
Suprema Corte e às defesas, de documentos essenciais à
instrução da denúncia e à exata compreensão da controvérsia .
3. Compete exclusivamente a esta Suprema Corte decidir sobre
eventual desmembramento do feito em relação aos coacusados
não detentores de prerrogativa de foro. Remessa
irrazoavelmente tardia, imotivada e apenas parcial da
investigação sobre fatos conexos - desmembrada por conta e
risco da autoridade policial -, além de proposição de ato
investigativo, na instância originária, diretamente dirigido a
detentor de prerrogativa de foro nesta Suprema Corte.
Preponderância da dúvida quanto à legalidade da base
probatória que pavimenta a denúncia . 4. Inexistência de
indícios de materialidade e autoria mínimas com relação ao
detentor de prerrogativa de foro, a impedir, a partir do enredo
da própria denúncia, um prognóstico fiável de confirmação da
hipótese acusatória, e a alcançar, por corolário, o corréu
remanescente. 5. Denúncia rejeitada por ausência de justa
causa. ( Inq 2.560, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma,
julgado em 08/03/2016).
Nessa linha, depois de oferecida a denúncia e notificado o
acusado para apresentar a resposta do art. 4º da Lei 8.038/90, não há
previsão legal e espaço para dilações probatórias tais como diligências,
requerimentos e oitivas.
O momento processual é destinado ao debate sobre a
existência do substrato probatório mínimo de autoria e de materialidade
delitiva para se verificar o preenchimento dos requisitos do art. 41 do
CPP, bem como sobre as hipóteses de rejeição previstas no art. 395 do
4
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.EDSONFACHIN
Inteiro Teor do Acórdão - Página 10 de 56 1758
INQ 3998 AGR / DF
CPP. Ao juízo não caberá exame aprofundado de mérito, mas tão somente
análise “prima facie” da denúncia.
A jurisprudência desta Suprema Corte é firme nesse
sentido. Cito, como exemplo, precedentes das duas Turmas, os quais não
levam grifos no original:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. OFERECIMENTO DE
DENÚNCIA. IMPUTAÇÃO DO CRIME DE CONCUSSÃO.
APTIDÃO DA DENÚNCIA. INDÍCIOS DE AUTORIA E
MATERIALIDADE DEMONSTRADOS. SUBSTRATO
PROBATÓRIO MÍNIMO PRESENTE. ATENDIMENTO DOS
REQUISITOS DO ART. 41 DO CPP. DENÚNCIA RECEBIDA. 1.
A fase processual do recebimento da denúncia é juízo de
delibação, jamais de cognição exauriente. Não se pode,
portanto, confundir os requisitos para essa fase, delineados
no art. 41 do Código de Processo Penal, com o juízo de
procedência ou não da imputação criminal . 2. No caso, a
denúncia contém a adequada indicação das condutas delituosas
imputadas, a partir de elementos aptos a tornar plausível a
acusação, permitindo o pleno exercício do direito de defesa. 3.
Está presente, ademais, substrato probatório mínimo em
relação à materialidade e à autoria. 4. Denúncia recebida.(Inq
3966, Rel. Min. Teori Zavascki, 2a. Turma, DJe 09.10.2015).
(...)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO INQUÉRITO.
RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. INCONFORMIDADE COM
A DECISÃO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU
OBSCURIDADE. 1. Os embargos de declaração não constituem
meio hábil para reforma do julgado, sendo cabíveis somente
quando houver no acórdão omissão, contradição ou
obscuridade, o que não ocorre no presente caso. 2. Na fase de
recebimento da denúncia não se faz um juízo aprofundado de
mérito, mas apenas uma análise perfunctória da denúncia e
do substrato probatório mínimo de autoria e materialidade
delitiva, de modo a se verificar o preenchimento dos
requisitos do art. 41 do CPP, bem como da não incidência de
5
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.EDSONFACHIN
Inteiro Teor do Acórdão - Página 11 de 56 1759
INQ 3998 AGR / DF
quaisquer das hipóteses de rejeição previstas no art. 395 do
CPP. 3. Embargos de declaração rejeitados. ( Inq 3331 ED,
Relator (a): Min. EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em
03/05/2016)
A fase processual que intermedeia o oferecimento da
denúncia e o juízo de recebimento ou rejeição da peça inaugural é
postulatória por excelência, razão pela qual não podem as partes, à
míngua de previsão legal, pretender uma instrução prévia. A única
exceção que se faz à prática de atos instrutórios em fases postulatórias
está na hipótese do art. 231 do Código de Processo Penal que dispõe:
“salvo os casos expressos em lei, as partes poderão apresentar documentos em
qualquer fase do processo“. A previsão excepcional de apresentação de
documentos em qualquer fase do processo, como igualmente previsto de
forma implícita no art. 5º da Lei 8038/90, tem sua razão de ser justamente
na facilidade da produção da prova documental, cujos elementos
ingressam de imediato nos autos.
Ainda assim, como toda e qualquer prova, tem sua
admissibilidade vinculada à análise do julgador que pode indeferir a
juntada dos documentos caso tenham caráter irrelevante, impertinente,
protelatório ou tumultuário, nos termos do art. 400, § 1º, do CPP.
Esta Suprema Corte tem reiteradamente decidido que não
viola os princípios da ampla defesa e contraditório o indeferimento
motivado de provas pleiteadas pelas partes com base no art. 400, § 1º, do
CPP. Nesse sentido: RHC 115.133, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, Dje
21/02/2014; HC 106.734, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, DJe
de 04/05/2011; HC 108.961, Rel. Min. Dias Toffoli, 1ª Turma, DJe de
08/08/2012.
Especificamente no que diz respeito à juntada inoportuna
de documentos, o Superior Tribunal de Justiça vem decidindo que “A
regra insculpida no art. 231 do CPP, no qual se estabelece que as partes poderão
apresentar documentos em qualquer fase do processo não é absoluta, sendo que
nas hipóteses em que forem manifestamente protelatórias ou tumultuárias podem
ser indeferidas pelo magistrado” ( HC 250.202/SP, Rel. p/ Acórdão Min.
6
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.EDSONFACHIN
Inteiro Teor do Acórdão - Página 12 de 56 1760
INQ 3998 AGR / DF
Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 10.09.2013).
Isso significa que a atividade probatória das partes no
período que intermedeia o oferecimento da denúncia e a manifestação do
órgão julgador sobre a admissibilidade da acusação é rigorosamente
limitada e dotada de caráter excepcionalíssimo.
Do contrário, o rito previsto na Lei nº 8.038/90, que
delimita com clareza fases processuais postulatórias, instrutórias e
decisórias restaria esvaziado e entregue ao dispor das partes.
A invocação do princípio da ampla defesa, nessa linha, não
autoriza às partes promover a subversão do rito, criando uma infindável
gama de demandas por diligências prévias ao julgamento da
admissibilidade da acusação.
O exercício do direito de defesa é regulado pela lei que
estabelece o rito processual e contempla o momento em que provas
podem ser pleiteadas, devem ser deferidas e podem ser produzidas.
No caso, o Ministério Público pleiteou juntada de
documentos depois de iniciado o próprio julgamento sobre a
admissibilidade da acusação e a defesa pretende a manutenção desses
documentos nos autos com nova concessão de vista para manifestação a
respeito dos documentos. Ou seja, pretende-se a suspensão do
julgamento para a reabertura dos debates a respeito da admissibilidade
da acusação.
Trata-se de momento processual, portanto, inadequado à
produção probatória, sob pena de subversão do rito processual.
Como é ônus da acusação assegurar-se de que a denúncia
está suficientemente embasada, por não haver previsão legal, tampouco
espaço para produção probatória na atual quadra processual, ou os
elementos apontados pela defesa como faltantes são essenciais e sua
falta acarretará a rejeição da denúncia , ou instaurar-se-á o processo
penal, locus no qual terão as partes oportunidade de propor e produzir
suas provas.
Por fim, quanto à alegação segundo a qual restou sem
resposta a insurgência da defesa contra a certidão parcial de julgamento,
7
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.EDSONFACHIN
Inteiro Teor do Acórdão - Página 13 de 56 1761
INQ 3998 AGR / DF
dando conta de que o voto do saudoso Ministro Teori Zavascki foi
proferido para receber integralmente a denúncia, enquanto que o
agravante entende que o recebimento foi parcial, consigno que não cabe a
este Relator, que não participou da sessão, propor qualquer reparo à
proclamação parcial do julgamento, cuja atribuição regimental é do
eminente Ministro Presidente da Segunda Turma (art. 135, § 2º, do
RISTF).
Sendo assim, nego provimento ao agravo regimental.
É como voto.
8
Supremo Tribunal Federal
Esclarecimento
Inteiro Teor do Acórdão - Página 14 de 56 1762
04/04/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
ESCLARECIMENTO
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN - Sim, favor assomar à
tribuna.
O SENHOR HAMILTON CARVALHIDO (ADVOGADO) - O
primeiro esclarecimento é relativo ao "(...) salvo, deve ser defeito do
advogado"; eu penso, talvez, não tenha entendido, mas o que eu entendi
foi que Sua Excelência, o eminente Relator, disse que a defesa teria se
manifestado, primeiro, para que não fosse permitida a juntar documento.
Não existe isso.
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (RELATOR) - Vossa
Excelência me permite? Creio que houve um equívoco, provavelmente,
da minha expressão "deficiência", e não da compreensão acutíssima de
Vossa Excelência. Essa afirmação não foi feita.
O SENHOR HAMILTON CARVALHIDO (ADVOGADO) - Bom, aí
depende então de quem ouviu, porque eu ouvi isso.
Supremo Tribunal Federal
AntecipaçãoaoVoto
Inteiro Teor do Acórdão - Página 15 de 56 1763
04/04/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
ANTECIPAÇÃO AO VOTO
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Senhor Presidente, cumprimento o eminente Relator, os eminentes
Pares, a Subprocuradora-Geral da República, os eminentes advogados, as
senhoras e os senhores presentes. Eu tive a oportunidade de receber o
voto do eminente Relator em relação a esse agravo e também encaminhei
a Sua Excelência - ainda pela manhã, ao gabinete de Sua Excelência, não
sei se o gabinete fez chegar a suas mãos - minha posição divergente. Sou
o vistor do caso, cujo julgamento já iniciou.
E, aqui, eu gostaria de destacar, Ministro Luiz Edson Fachin ,
Ministro Lewandowski e Ministro Gilmar , que esse julgamento teve
início, sob a relatoria do saudoso Ministro Teori Zavascki , em 22 de
novembro de 2016. Em 22 de novembro, eu pedi vista dos autos. No dia
16 de janeiro - estou acompanhando aqui pelo andamento na internet -,
portanto, antes de eu liberar a vista, Dra. Claudia, o processo ainda em
meu Gabinete, veio uma petição da Procuradoria-Geral da República
juntando documentos. Essa petição foi juntada aos autos. Em 16 de
janeiro de 2017, ainda não havia ocorrido o trágico acidente que vitimou o
querido e saudoso Ministro Teori Zavascki . Eu, como vistor, tive acesso a
esses documentos. Isso é extremamente relevante para essa análise. Eu
tive acesso a esses documentos.
Pois bem! Houve o trágico acidente. Foi determinada a
redistribuição dos autos em 14 de fevereiro. Eu só poderia liberar esses
autos para julgamento havendo Relator. Com o falecimento do Ministro
Teori Zavascki , não havia Relator. Havia duas opções: ou se designaria o
novo Relator - a Presidente teve que decidir, durante o recesso, se esses
casos iriam esperar o sucessor do saudoso Ministro Teori Zavascki , a ser
ainda indicado -, ou se, desde de logo, se redistribuiria o caso, como o
Procurador-Geral da República requereu. E foi redistribuído. E, num
conjunto de outros processos, foi redistribuído ao Ministro Edson Fachin .
Supremo Tribunal Federal
AntecipaçãoaoVoto
Inteiro Teor do Acórdão - Página 16 de 56 1764
INQ 3998 AGR / DF
Essa redistribuição consta do dia 14 de fevereiro de 2017.
Já estavam, em meu Gabinete e nos autos esses documentos. Eu
liberei o processo para julgamento, tendo tido acesso a esses documentos,
para a continuidade de julgamento. Sobreveio petição direcionada a mim,
requerendo a defesa acesso àqueles documentos, e a transformação do
julgamento em diligência para análise e pronunciamento.
Eu poderia ter deliberado sobre aquilo não sendo Relator? Entendi
que não, entendi que não; e encaminhei ao novo Relator. O novo Relator,
num pedido da defesa de acesso, não só negou o acesso, como mandou
desentranhar, determinou o desentranhamento. Sobreveio o agravo.
Tenho um voto por escrito, do qual irei fazer a leitura, Senhor
Presidente. Porém, já digo e adianto que, na ação penal, eu traria uma
questão de ordem. Vencido no agravo, eu trago uma questão de ordem:
que os documentos retornem aos autos. Se entendermos aqui por não se
darmos vista à defesa, que, pelo menos, os documentos retornem aos
autos, porque eu tive acesso a eles como vistor, mas hoje eles estão
subtraídos de minha análise.
Essa é uma questão, para mim, extremamente relevante. E nós temos
que ter cuidado, porque aqui é instância única de julgamento. E aquilo
que decidimos aqui tem reflexo para as outras instâncias.
Veja, Vossa Excelência, que hoje de manhã, na ação talvez, do ponto
de vista político, mais importante da história da Justiça Eleitoral brasileira
e da história política brasileira, o Tribunal Superior Eleitoral, com a maior
dignidade, com a maior correção, verificou: não há maturidade ainda,
não está madura a situação, para o julgamento desta ação. E inclusive o
próprio Relator reconheceu que era necessário se conceder o prazo
adequado e se ouvirem outras testemunhas.
Então, com a devida vênia do eminente Relator - que não foi o autor
do voto, o autor do voto inicial foi o Ministro Teori -, eu não vejo
procrastinação na petição da defesa. E, data venia , eu passo à leitura de
meu voto, Senhor Presidente, feita essa introdução.
Por intermédio da Petição 912, de 2017, o Procurador-Geral da
República assim se manifestou - e leio a manifestação do Procurador2
Supremo Tribunal Federal
AntecipaçãoaoVoto
Inteiro Teor do Acórdão - Página 17 de 56 1765
INQ 3998 AGR / DF
Geral da República, que penso que agiu com extrema lealdade
processual. Ele recebeu a documentação e a juntou.
Aliás, Senhor Presidente, veja que o Conselho Nacional do
Ministério Público - ainda não vou à leitura voto - alterou normas
internas. Nos procedimentos de inquéritos civis, inquéritos
investigatórios, no âmbito do Ministério Público, o Conselho Nacional do
Ministério Público deu o direito à defesa de ter acesso aos autos, no
âmbito ainda inquisitorial, sob pena de nulidade. É a Resolução nº 161, de
21 de fevereiro de 2017 - resolução aprovada, em Plenário, em 21 de
fevereiro deste ano: "alterou normas internas sobre procedimentos
investigatórios criminais, inquéritos civis, no próprio âmbito interno do
Ministério Público, para definir que advogados podem acompanhar
interrogatórios, sob pena de nulidade absoluta, examinar autos de
investigações findas ou em andamento, podendo copiar peças e tomar
apontamentos em meio físico ou digital". Isso ainda está fora do âmbito,
necessariamente, de uma deliberação colegiada no âmbito do Supremo
Tribunal Federal - e aqui estamos no âmbito do Supremo Tribunal
Federal.
3
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.DIASTOFFOLI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 18 de 56 1766
04/04/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
VOTO
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Trata-se inquérito no qual foi oferecida denúncia contra o Deputado
Federal Eduardo da Fonte, imputando-lhe participação em crime de
corrupção passiva majorada (art. 317, § 1º, c/c o art. 29, CP).
Em sessão de 22/11/16, após o voto do eminente Relator, rejeitando
as preliminares arguidas e recebendo integralmente a denúncia, pedi
vista regimental dos autos para melhor examinar os argumentos
esgrimidos da tribuna pelo digno Defensor, Dr. Hamilton Carvalhido, em
sua sustentação oral.
Os autos foram conclusos ao meu gabinete em 23/11/16, e, em
16/01/17, foi protocolada a petição nº 912/17, do Procurador-Geral da
República, com a seguinte manifestação:
“(...)
Com o intuito de instruir o presente Inquérito, o
Procurador-Geral da República solicitou ao Presidente do
Senado Federal, por intermédio do Ofício nº 72/GTLJ/PGR, o
encaminhamento dos registros de áudio da participação, no dia
14.7.2009, do ex-Senador SÉRGIO GUERRA em Comissão
Parlamentar de Inquérito, bem como dos registros de áudio, no
dia 7.8.2013, da participação do Deputado Federal EDUARDO
HENRIQUE DA FONTE DE ALBUQUERQUE SILVA na
audiência pública da Comissão de Minas e Energia.
O referido ofício foi remetido após a Polícia Federal
requerer nestes autos intervenção judicial com vistas à obtenção
de arquivos e informações registrados no Senado Federal, sob o
argumento de expedidos pela autoridade policial para
instrução da investigação sob exame.
A Procuradoria-Geral da República, contudo, entendendo
para tanto ser desnecessária qualquer intervenção judicial,
solicitou diretamente ao Senado Federal as informações em
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.DIASTOFFOLI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 19 de 56 1767
INQ 3998 AGR / DF
comento mediante o ofício em referência, conforme informado
nestes autos ao Supremo Tribunal Federal na manifestação
ministerial de fls. 1.067/1.068.
Em seguida, o Presidente do Senado Federal remeteu o
Ofício nº 54/2016-PRESID/ADVOSF, no qual encaminhou à
Procuradoria-Geral da República fisicamente e em mídia digital
apenas os registros de áudio da participação, no dia 14.7.2009,
do ex-Senador SÉRGIO GUERRA em Comissão Parlamentar de
Inquérito. Quanto ao registro de áudio, no dia 7.8.2013, da
participação do Deputado Federal EDUARDO HENRIQUE DA
FONTE DE ALBUQUERQUE SILVA na audiência pública da
Comissão de Minas e Energia, o Senado Federal esclareceu se
tratar de material a ser obtido junto à Câmara dos Deputados,
’uma vez que as informações requeridas são sobre reunião de Comissão
daquela Casa Legislativa’.
Nesse sentido, o Ministério Público Federal vem informar
o Supremo Tribunal Federal já haver solicitado à Presidência
da Câmara dos Deputados, por intermédio do ofício em anexo,
os dados em questão, que deverão ser juntados aos presentes
autos tão logo serem recebidos neste órgão ministerial.
Por fim, o Procurador-Geral da República vem requer a
juntada das informações prestadas pelo Senado Federal através
do Ofício nº 54/2016-PRESID/ADVOSF, para instrução dos
presentes autos.”
Esse pronunciamento da Procuradoria-Geral da República veio
instruído com informações prestadas pela Advocacia-Geral do Senado,
contendo a íntegra de notas taquigráficas e mídia em CD com a gravação
em vídeo de reunião da CPI da Petrobras em 14/07/09.
Em 14/02/17 o feito foi redistribuído ao eminente Ministro Edson
Fachin.
Em 16/02/17, foi juntada aos autos a petição nº 912/17 do Parquet ,
sendo que, na mesma data, os autos foram restituídos ao meu gabinete na
qualidade de vistor do processo, consoante noticiado no andamento
processual do sítio eletrônico da Corte. Portanto, tomei conhecimento da
2
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.DIASTOFFOLI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 20 de 56 1768
INQ 3998 AGR / DF
petição e dos documentos que a acompanharam.
Somente após essa cientificação, em 7/3/17, concluí meu voto vista
e devolvi o processo para a continuação de julgamento.
Em 13/3/17 foi juntada aos autos a petição nº 10.978/17 da defesa do
denunciado Eduardo Henrique da Fonte de Albuquerque Silva, na qual
aduziu que não teve ciência da referida petição do Ministério Público
Federal nem a oportunidade de sobre ela se manifestar, razão por que
requereu vista dos autos e a concessão de prazo para manifestação.
Alegou, ainda, que o resultado parcial da sessão de julgamento,
publicado em 22/11/16, não corresponderia ao voto proferido pelo então
Relator, Ministro Teori Zavascki , que, ao ver da defesa, “assentiu
claramente com a retificação da denúncia, por parte do Ministério Público
Federal, que excluiu da imputação a modalidade ‘recebimento’,
restringindo a acusação à solicitação de vantagem indevida”.
Considerando-se que já tinha procedido à devolução da vista
regimental para retomada do julgamento, determinei, em 13/03/17, o
encaminhamento dos autos ao eminente Relator, a quem competia
deliberar sobre os requerimentos formulados pela defesa.
Ao apreciar a questão, o Ministro Edson Fachin determinou o
desentranhamento da petição da Procuradoria-Geral da República e dos
documentos que a instruíam, em decisão assim fundamentada:
“Após iniciado o julgamento em que o saudoso Ministro
Teori Zavascki, a quem sucedi na relatoria deste feito, proferiu
voto para receber integralmente a denúncia, encontravam-se os
autos com o eminente Ministro Dias Toffoli em razão de pedido
de vista (Certidão de fls. 1635), quando o Procurador-Geral da
República protocolou petição informando a respeito de
providências e juntando documentos.
Diante disso, o denunciado Eduardo Henrique da
Fonte de Albuquerque Silva, às fls. 1684-1685, requereu “diante
da necessidade absoluta da ciência e pronunciamento do Requerente
acerca da prova trazida aos autos, em meio do julgamento do
recebimento ou não da denúncia e potencialmente capaz de influir na
3
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.DIASTOFFOLI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 21 de 56 1769
INQ 3998 AGR / DF
sua decisão, vista dos autos e prazo para manifestação, assegurandose, assim, o pleno exercício do direito de defesa”.
Às fls. 1.715-1.716, o eminente Ministro Dias
Toffoli encaminha os autos a este Gabinete, uma vez que já
devolvida a vista, para deliberar sobre o pedido da defesa.
Relatei.
Decido.
Sem adentrar, neste momento, na análise da
alegada indispensabilidade ou não da providência pretendida
pela defesa, em face da juntada de documentos pelo Ministério
Público após iniciado o julgamento sobre o recebimento ou
rejeição da denúncia, importa considerar que na fase processual
que intermedeia o oferecimento da denúncia e a decisão sobre
seu recebimento ou rejeição não há previsão legal de dilação
probatória.
o oferecer a denúncia, o Ministério Público formula sua
opinio delicti e a apresenta ao Poder Judiciário para controle,
cabendo a este último acatar a acusação instaurando o processo
penal ou rejeitar a denúncia.
É ônus da acusação, portanto, assegurar-se de que a
denúncia está embasada em elementos probatórios capazes de
configurar indícios de materialidade e autoria delitivas
suficientes à configuração da justa causa. À míngua desses
elementos, impor-se-á a rejeição da denúncia, o que não impede
a propositura de nova denúncia, desta feita melhor embasada
em provas.
Por não haver previsão legal, nem mesmo espaço para
produção probatória nesta fase processual, máxime quando
iniciado o julgamento, não pode o Ministério Público, a não ser
que o faça a título de aditamento da denúncia, reforçar o
arcabouço probatório, principalmente depois que a defesa já
apresentou sua resposta.
Sendo assim, determino o desentranhamento da petição
e documentos das fls. 1637-1669, devolvendo-a ao Ministério
Público Federal, sem prejuízo de ulterior juntada no curso de
eventual processo penal a ser instaurado quando de sua fase
4
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.DIASTOFFOLI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 22 de 56 1770
INQ 3998 AGR / DF
probatória ou, caso rejeitada a denúncia por falta de justa causa,
quando do eventual oferecimento de uma nova denúncia.
Resta, assim, prejudicado o pedido da defesa das fls.
1684-1685.
Desentranhem-se, ainda, o contido nas fls. 1.672-1.678
pois tratam-se de expedientes e despachos referentes ao Inq
3.988, os quais foram erroneamente endereçados aos presentes
autos, procedendo-se à juntada naquele feito.
Considerando que o eminente Ministro Dias Toffoli
informa que já procedeu à devolução da vista, inclua-se o feito
no calendário da Segunda Turma do dia 21 de março próximo
vindouro, para continuidade do julgamento.”
Essa é a razão pela qual se insurge a defesa neste agravo regimental.
Para o agravante, a decisão que determinou o desentranhamento dos
documentos e a sua devolução ao Ministério Público Federal, “sem
prejuízo de ulterior juntada no curso de eventual processo penal a ser
instaurado quando de sua fase postulatória ou, caso rejeitada a denúncia
por falta de justa causa, quando do eventual oferecimento de uma nova
denúncia”, vilipendiou o postulado constitucional da ampla defesa, na
medida em que usurpou da defesa o direito de conhecer a prova e sobre
ela se manifestar
“ antes do prosseguimento do julgamento, até porque já
foi disponibilizada nos autos aos julgadores, nele se encontra
juntada e sobretudo porque certifica, de forma peremptória, a
inocência do Imputado, desmentindo, apontando, mais uma
vez, de modo suficiente para a falta de justa causa para a ação
penal, senão para absolvição do imputado” (grifos do autor).
Em sua visão,
“trata-se de prova própria do inquérito, determinada e
produzida pelo Estado, indispensável ao conhecimento da
verdade e assim influente na decisão do julgamento, que não
5
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.DIASTOFFOLI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 23 de 56 1771
INQ 3998 AGR / DF
pode e não deve ser desterrada do processo, mormente sob a
égide do Estado Democrático de Direito”.
Afirma, ainda, que “não [foi] apreciado, o pedido da defesa, relativo
à divergência apontada entre o voto do então relator e a certidão do
resultado parcial do julgamento”.
Nesse sentido, pleiteia
“[d]iante da necessidade absoluta da ciência e
pronunciamento do Requerente acerca da prova trazida aos
autos, em meio do julgamento do recebimento ou não da
denúncia e potencialmente capaz de influir na sua decisão em
favor do imputado, vista dos autos e prazo para manifestação,
assegurando-se, assim, o pleno exercício do direito de defesa,
[bem como seja juntada nos autos] a transcrição da fala
Ministerial e do voto oral proferido pelo Relator Teori Zavascki,
os quais não se ajusta a certidão do resultado parcial do
julgamento”.
É o relatório
Passo à análise do caso.
Como já tive a oportunidade de me manifestar, o fato de as
investigações no inquérito não se realizarem em contraditório não
prejudica o exercício da ampla defesa (v.g. Rcl nº 21.258-AgR/PR,
Segunda Turma, de minha relatoria , DJe de 20/4/16).
Esse, aliás, é o espírito que compreende a Súmula Vinculante nº 14
do Supremo Tribunal Federal,
“é direito do defensor, no interesse do representado, ter
acesso amplo e irrestrito aos elementos de prova que, já
documentados em procedimento investigatório, realizado por
órgão de competência de polícia judiciária, digam respeito ao
exercício do direito de defesa” .
Portanto, não obstante o entendimento do eminente Relator quanto à
6
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.DIASTOFFOLI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 24 de 56 1772
INQ 3998 AGR / DF
inexistência de previsão legal para dilação probatória na fase processual
que intermedeia o oferecimento da denúncia e a decisão sobre seu
recebimento, tenho que razão assiste ao agravante, na medida em que, à
luz do contraditório e da ampla defesa, lhe é de direito ter acesso aos
elementos de prova documentados nos autos, ainda que
extemporaneamente .
Tal como se deu na espécie, os documentos juntados aos autos pela
Procuradoria-Geral da República, com absoluta e inquestionável lealdade
processual, revelam circunstância que, na visão da defesa , não só
reforçaria a alegada tese de insubsistência de justa causa para a ação
penal, como teria potencial de influir na convicção dos julgadores a
respeito da rejeição da exordial acusatória.
Não se trata aqui de discutir o mérito sobre eventuais contradições
nos depoimentos de testemunhas e/ou colaboradores, que deverão ser
sopesadas ao cabo de regular instrução processual, mas da efetivação do
dogma constitucional do contraditório e da ampla defesa (CF, art. 5º,
LV) no tocante ao acesso dos elementos de prova trazidos à baila pela
própria acusação.
Ora, se o próprio titular da persecução pleiteou a juntada desses
documentos com o intuito de instruir o inquérito, e assim foi feito , não
vejo por que usurpar da defesa o direito ao contraditório , tão somente,
em razão de já se ter iniciado o julgamento, até porque, no atual estágio, é
legítimo que o acusado se apegue a qualquer elemento de prova que
julgue essencial à sua tese defensiva e que possa conduzir à eventual
rejeição da denúncia, na forma do art. 395 do Código de Processo Penal.
Daí porque reconheço a plausibilidade jurídica dos argumentos do
agravante.
Como ensina Ada Pellegrini Grinover , em obra de grande prestígio,
o objetivo principal da garantia do contraditório não é a defesa, no
sentido negativo de mera oposição ou resistência, mas sim a influência,
tomada “como direito ou possibilidade de incidir ativamente sobre o
desenvolvimento e o resultado do processo” (As garantias constitucionais
do processo. In:______. Novas tendências do direito processual . Rio de
7
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.DIASTOFFOLI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 25 de 56 1773
INQ 3998 AGR / DF
Janeiro: Forense, 1990, p. 19).
Não basta, portanto, a mera ciência, sem a possibilidade de reação,
sob pena de tornar-se inócua a garantia do contraditório.
Nesse diapasão, no intuito de fazer prevalecer o princípio da
verdade material sobre os fatos, à luz da Constituição Federal, entendo
possível a conversão deste julgamento em diligência para ciência da
defesa quanto aos documentos outrora juntados pela acusação, máxime
em razão do que dispõe o art. 231 1 do Código de Processo Penal, que
autoriza às partes apresentarem documentos em qualquer fase do
processo, exceto quando a lei dispuser em sentido diverso, o que não é o
caso , já que o art. 9º da Lei nº 8.038/90 prescreve que, nas ações penais
originárias, “a instrução obedecerá, no que couber, ao procedimento
comum do Código de Processo Penal”.
Para Tourinho Filho,
“[s]egundo dispõe o art. 231, os documentos podem ser
apresentados, para a sua juntada aos autos, em qualquer fase
do processo. Evidente que, uma vez apresentados e dês que
permitida a sua juntada, sobre eles se manifestará a parte ex
adversa ” ( Código de Processo Penal comentado. 14. ed. São
Paulo; Saraiva, 2012.v.1, p. 723 – grifos nossos).
Esclarece ainda o renomado autor, dando ênfase à expressão “em
qualquer fase do processo”, que hoje, a única exceção à hipótese está no
1 Art. 231. Salvo os casos expressos em lei, as partes poderão apresentar documentos em
qualquer fase do processo.
2 Art. 479. Durante o julgamento não será permitida a leitura de documento ou a
exibição de objeto que não tiver sido juntado aos autos com a antecedência mínima de 3 (três)
dias úteis, dando-se ciência à outra parte. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)
Parágrafo único. Compreende-se na proibição deste artigo a leitura de jornais ou
qualquer outro escrito, bem como a exibição de vídeos, gravações, fotografias, laudos, quadros,
croqui ou qualquer outro meio assemelhado, cujo conteúdo versar sobre a matéria de fato
submetida à apreciação e julgamento dos jurados. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)
8
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.DIASTOFFOLI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 26 de 56 1774
INQ 3998 AGR / DF
Logo, ainda que a juntada desses documentos perpasse pelo crivo
judicial do órgão julgador, como no caso, sua instrumentalização na
hipótese dos autos, bem ou mal, confere legítimo direito de vista à defesa,
ainda que posteriormente venham a ser desentranhados, sem que se
desborde em prejuízo para o bom e regular andamento do processo, em
se tratando do postulado da razoável duração dos processos (CF, art. 5º,
inciso LXXVIII).
Aliás, esta Suprema Corte já admitiu a possibilidade a juntada de
documento isolado depois de ofertada a denúncia:
“INQUÉRITO. IMPUTAÇÃO DOS CRIMES PREVISTOS
NO ART. 317, § 1º, C/C ART. 327, § 2º, DO CÓDIGO PENAL E
ART. 1º, § 4º, DA LEI 9.613/1998. RÉPLICA PELA ACUSAÇÃO
ÀS RESPOSTAS DOS DENUNCIADOS. POSSIBILIDADE.
JUNTADA DE DOCUMENTO ISOLADO APÓS A OFERTA
DA DENÚNCIA. VIABILIDADE. INÉPCIA DA PEÇA
ACUSATÓRIA. INOCORRÊNCIA. DESCRIÇÃO
INDIVIDUALIZADA E OBJETIVA DAS CONDUTAS
ATRIBUÍDAS AOS DENUNCIADOS, ASSEGURANDO-LHES
O EXERCÍCIO DO DIREITO DE DEFESA. ATENDIMENTO
OS REQUISITOS DO ART. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO
PENAL. (...) DENÚNCIA PARCIALMENTE RECEBIDA” (Inq
nº 3997/DF, Segunda Turma, Relator o Ministro Teori Zavascki ,
DJe de 26/9/16 – grifos nossos).
Conforme destacou o saudoso Ministro Teori Zavascki ao votar no
caso paradigma,
“é possível assegurar, também no âmbito da Lei
8.038/1990, o direito ao órgão acusador de réplica às respostas
dos denunciados, especialmente quando suscitadas questões
que, se acolhidas, poderão impedir a deflagração da ação penal.
Só assim se estará prestigiando o princípio constitucional do
contraditório (art. 5º, LV, CF), que garante aos litigantes, e não
apenas à defesa, a efetiva participação na decisão judicial”.
9
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.DIASTOFFOLI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 27 de 56 1775
INQ 3998 AGR / DF
Sua Excelência asseverou, ainda, que
“não importa em violação aos princípios do contraditório
e da ampla defesa a juntada de documento isolado após a
oferta da denúncia, pois, além de essa possibilidade estar
prevista no art. 231 do Código de Processo Penal, no caso,
tiveram as defesas a oportunidade de sobre ele se manifestar,
em sua inteireza , não ocorrendo qualquer alteração ou
incremento de acusação em virtude do referido documento“
(grifos nossos).
A meu sentir, a ratio decidendi deste precedente, à luz do art. 231 do
Código de Processo Penal, deve ser aplicada ao caso concreto, uma vez
que seu andamento processual, obtido no sítio eletrônico da Corte, deixa
claro que a petição da Procuradoria-Geral da República foi juntada aos
autos pela Secretaria Judiciária da Corte, ato de mero expediente que,
portanto, prescinde de decisão judicial, na exata dicção do art. 93, inciso
XIV, da Constituição Federal, introduzido pela Emenda Constitucional nº
45/04, que assim dispõe:
“XIV os servidores receberão delegação para a prática de
atos de administração e atos de mero expediente sem caráter
decisório; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de
2004)”.
Em estrita observância a esse preceito constitucional, o Supremo
Tribunal Federal editou, em 17/11/08, a Resolução nº 384, que
regulamentou a prática de atos processuais no âmbito da Secretaria
Judiciária, sendo pertinente ressaltar o que prescreve o seu art. 1º, caput e
§ 2º. Transcrevo:
“Art. 1º A Secretaria Judiciária – SEJ juntará aos
processos ou autos, independentemente de despacho , as
petições apresentadas, ressalvada orientação diversa do Relator.
10
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.DIASTOFFOLI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 28 de 56 1776
INQ 3998 AGR / DF
(…)
§ 2º Nos casos em que houver determinação de devolução
ou de arquivamento de petição, a SEJ procederá ao
desentranhamento ” (grifos nossos).
Portanto, não havendo dúvidas de que os documentos foram
juntados aos autos em ato de mero expediente da Secretaria da Corte,
reitero o legítimo direito de vista da defesa, razão que me conduz ao
acolhimento da pretensão do agravante.
No tocante ao pleito de juntada aos autos da transcrição da fala
ministerial e do voto oral proferido pelo então Relator, o saudoso
Ministro Teori Zavascki , assento que o exame de tal providência incumbe
ao atual relator da causa, consoante dicção do art. 96, § 7º, do RISTF,
verbis :
“o Relator sorteado ou o Relator para o acórdão poderá
autorizar, antes da publicação, a divulgação, em texto ou áudio,
do teor do julgamento”.
De toda sorte, não sobressai prejuízo para o agravante sua não
juntada até aqui, visto que a defesa, à fl. 1685 dos autos, afirmou que “tal
fala do Ministério Público Federal e voto do Relator (...) foram juntadas
no memorial da Defesa (...)”.
Ademais, como bem asseverou o Ministro Edson Fachin em seu
voto, o reparo à proclamação parcial do julgamento é de atribuição
regimental do Presidente da Turma (RISTF, art. 135, § 2º).
Nessa conformidade, pedindo venia ao relator, provejo
parcialmente o agravo para, convertendo o julgamento em diligência,
determinar a reinserção nos autos da petição e dos documentos da
Procuradoria-Geral da República já desentranhados, bem como seja
conferida vista à defesa para, querendo, manifestar-se sobre eles no prazo
de 5 (cinco) dias, contados da ciência de sua juntada.
É como voto.
11
Supremo Tribunal Federal
ConfirmaçãodeVoto
Inteiro Teor do Acórdão - Página 29 de 56 1777
04/04/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
CONFIRMAÇÃO DE VOTO
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (RELATOR) - Senhor
Presidente, se Vossa Excelência e os eminentes Pares me permitem, eu
queria, antes de mais nada, enaltecer o voto que traz à colação o eminente
Ministro Dias Toffoli, que, como não poderia deixar de ser, é uma
contribuição relevante a esse debate sobre o qual dúvida alguma há, no
sentido de que tem relevo, pertinência.
Portanto, enalteço Sua Excelência, bem como a referência que fez ao
transcurso processual, registrando que, tal como de fato se sucedeu,
recebi este feito já após o ilustre e saudoso Ministro Teori Zavascki ter
proferido voto, e estar em fase de voto-vista perante Sua Excelência o
Ministro Dias Toffoli, quando sobrevêm a apresentação e o encartamento
nos autos desses documentos. O eminente Ministro Dias Toffoli libera,
devolve a vista; e obviamente submete essa matéria documental - ou seja,
remete na verdade - ao Relator, que era o Ministro Dias Toffoli, que a nós
tocou por sucessão, porque, por evidente, o exame do deferimento ou não
de juntada de documento compete ao Relator.
Aliás, estou de inteiro acordo com a citação que o Ministro Dias
Toffoli faz - e Tourinho Filho, que agora acabo de ver, ao receber seu bemlançado voto, em folha 7 -, dizendo que "uma vez apresentado, e desde
que permitida a sua juntada, sobre ele se manifestará a parte adversa".
No caso presente, pelo menos, coligindo e revendo aqui os dados
processuais, não me parece - posso estar obviamente equivocado, e Sua
Excelência pode ter essa informação - que o Ministro Teori Zavascki tenha
determinado a juntada dos documentos. Os documentos foram
encartados nos autos, se não me falha...
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Eu não disse isso.
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (RELATOR) - Não, sem
dúvida.
Supremo Tribunal Federal
ConfirmaçãodeVoto
Inteiro Teor do Acórdão - Página 30 de 56 1778
INQ 3998 AGR / DF
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Eles foram encartados, e eu tive conhecimento deles.
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (RELATOR) - Isso, eles
foram encartados.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Os autos estavam em meu gabinete.
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (RELATOR) -Perfeitamente.
Eles foram encartados, Vossa Excelência teve conhecimento.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
E liberei depois o voto-vista.
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (RELATOR) - Então,
confirma-se a percepção sobre a qual eu tinha dúvida, de que não houve,
de fato, uma apreciação sobre a juntada dos documentos.
Logo, estou de acordo com a citação que Vossa Excelência faz de
Tourinho Filho, desde que permitida a juntada dos autos. E aqui não
houve essa decisão, portanto, pelo que se pode depreender.
E creio que - sem embargo dos direitos que são indispensáveis, de
observância inderrogável das partes, da ampla defesa, da produção
probatória - a direção do processo, de um modo geral, há de ser dada ao
juízo, que, portanto, defere ou não a juntada de documentos os quais
foram entranhados aos autos. O que me pareceu, naquele momento, é que
o julgamento já havia sido iniciado.
O Ministério Público apresenta para encartar esses documentos a
destempo. A parte vem e pede acesso aos documentos, ela não se
manifesta, nem, obviamente, declina, que tem esta ou aquela impressão
dos documentos. Ao contrário, perfeitamente como dito pelo Ministro
Dias Toffoli - aliás, esclarecido de modo escorreito da tribuna -, a parte
pede acesso aos documentos de um encartamento documental realizado
de forma, de modo serôdio, pelo Ministério Público.
Portanto, o que me pareceu: ou os documentos que já estavam nos
autos embasariam a denúncia formulada pelo Ministério Público, e a
denúncia é recebida, ou esse documento ou a falta de documentos, de tão
2
Supremo Tribunal Federal
ConfirmaçãodeVoto
Inteiro Teor do Acórdão - Página 31 de 56 1779
INQ 3998 AGR / DF
essencial que é a falta, a denúncia deve ser rejeitada.
E, aqui, obviamente, não se está a julgar o mérito da ação penal,
como aliás, pode-se sugerir o exemplo de acolher esse pedido para fazerse a perícia, para que se faça um juízo definitivo. Nós estamos numa fase
de exame de indícios de materialidade, de autoria suficientes para
eventualmente instaurar a ação penal.
E, portanto, com todas as vênias - agora quem as pede sou eu ao
eminente Ministro Dias Toffoli -, a percepção inicial que tenho é de que o
ônus deve recair sobre o Ministério Público. E eu não seria de uma
bonomia a este ponto de saudar o proceder do Ministério Público. O
Ministério Público, aqui, agiu de uma maneira fora do seu tempo de vida;
de uma maneira que deveria, antes de tudo, aguardar para que o pedido
de juntada fosse ou não deferido, ou seja, o Ministério Público, por ação,
contribuiu para essa circunstância tumultuária. E, na condição de Relator
sucessor, entendi que o fluir natural era auscultar o voto vista e
prosseguir-se no julgamento, desentranhando esses documentos.
E é assim, data venia, o que continua a me parecer, pedindo, portanto,
aqui, licença ao Ministro Dias Toffoli, compreendendo as bem-lançadas
razões de Sua Excelência, e compreendendo o fato de que Sua Excelência
ter tido acesso a esses documentos, eu não deixo e nem poderia deixar de
ter isso em ponderação, mas esses documentos não tiveram sua juntada
deferida; esses documentos foram juntados fora de tempo, e se eles são
tão essenciais assim, essa denúncia deveria, então, merecer a sua
respectiva rejeição.
Portanto, Senhor Presidente, pedindo então vênias ao Ministro Dias
Toffoli, mantenho o voto pelo não acolhimento do agravo regimental.
3
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.RICARDOLEWANDOWSKI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 32 de 56 1780
04/04/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
VOTO
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Senhor
Presidente, cumprimento o Relator, Ministro Edson Fachin, e o Ministro
Dias Toffoli.
Começo relembrando o antigo brocardo jurídico, muito conhecido
aliás, segundo o qual "Quod non est in actis non est in mundo”, aquilo que
não está nos autos não está no mundo, e não pode ser objeto de
consideração por parte do julgador.
Sem embargo da belíssima argumentação que traz o Ministro Dias
Toffoli, eu ousaria dizer que esses documentos que foram" juntados "pelo
Ministério Público, jamais integraram os autos. Eles não integraram, nem
integram os autos.
Por quê? Em primeiro lugar, porque, apesar do art. 231 do Código de
Processo Penal admitir a juntada de documentos aos autos a qualquer
tempo, essa juntada não é automática. Ela depende do crivo do julgador,
do juiz, no caso da instância singular, ou, nos colegiados, dos relatores,
como é o caso.
Entretanto, há mais: o nosso Regimento Interno, no art. 21, I,
estabelece que são atribuições do Relator ordenar e dirigir o processo.
Toda vez - e quem tem prática forense, e todos nós temos, aqui, nesta
bancada -, toda vez que alguém pretende juntar um processo aos autos, o
juiz apõe, na primeira página, aquela famoso j, que é o" junte-se "; e esta
determinação de juntada não houve em nenhum momento.
O que ocorreu aqui no caso? A secretaria, por um deslize, ou até por
uma prática que tem, remeteu os documentos que o Ministério Público
pretendia juntar, não ao gabinete do Relator, porque os autos lá não se
encontravam, mas ao gabinete do Juiz-Vistor, do Ministro Dias Toffoli.
Mas como normalmente ocorre, a secretaria coloca, ou deveria colocar,
essa petição e os documentos anexos, na contracapa do processo,
juntamente com um clip, para que a autoridade de direito determine ou
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.RICARDOLEWANDOWSKI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 33 de 56 1781
INQ 3998 AGR / DF
não a juntada. Eventualmente, possivelmente, esses documentos foram
entranhados nos autos, mas entranhados oficiosamente pela secretaria. É
um ato desprovido de qualquer validade jurídica, a meu juízo. Por quê?
Porque não houve a determinação do Relator, que é o juiz responsável
pela ordenação do processo, para que esses documentos integrassem
oficialmente os autos. Então, por enquanto, a meu ver, são documentos
apócrifos, não podem ser considerados de forma nenhuma por quem
quer que seja, porquanto não houve a determinação legal e regulamentar
para a juntada deles nos autos.
Até ousaria dizer, Ministro Fachin, com todo o respeito, que Vossa
Excelência, ao invés de determinar o desentranhamento de petição e
documentos de folhas" tais "dos autos - Vossa Excelência fez isso ad
cautelam, certamente - talvez Vossa Excelência devesse simplesmente ter
indeferido a juntada, pois entranhados nos autos eles não estavam,
estavam mecanicamente, faticamente, mas não juridicamente. Em
nenhum momento esses documentos integraram os autos. Não podiam
ser examinados por quem quer que fosse, porque não houve o
beneplácito do Relator.
Não estão mais nos autos. Jamais poderiam ter estado nos autos.
Não têm nenhuma consequência jurídica. Não repercutem sobre a
denúncia. Foram juntados - houve a pretensão de juntada - a destempo,
por parte do Ministério Público, porque o julgamento já se iniciara.
Houve um pedido de vista. Esse pedido do Ministério Público, que não
foi objeto de deferimento, nem indeferimento, é absolutamente
extemporâneo. Está lá" juntado aos autos ", ou" ligado aos autos ", mas não
houve uma juntada oficial. O Ministro-Relator, tão logo teve ciência desta
pretendida juntada extemporânea, mandou tirá-los dos autos.
Não há prejuízo para quem quer que seja, porque a denúncia haverá
de ser examinada, tal como formulada oficialmente - originalmente,
melhor dizendo - e, claro, oficialmente também.
Sua Excelência o Relator teve o cuidado de dizer que,
oportunamente, quiçá na fase probatória, esses documentos poderão ser
novamente juntados e aí, então, a defesa terá acesso a eles e poderá
2
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.RICARDOLEWANDOWSKI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 34 de 56 1782
INQ 3998 AGR / DF
manifestar-se como entender de direito.
Então, Ministro Toffoli, não se aplica aquela súmula do Supremo que
diz que as partes têm direito de acessar todos os documentos que se
encontram nos autos, porque eles jamais - insisto nesse aspecto -integraram os autos oficialmente.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Permite-me um aparte?
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Pois não.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Com o advento da Emenda Constitucional nº 45, de 2004, o inciso
XIV do art. 93 da Constituição Federal recebeu a seguinte redação:
"Os servidores receberão delegação para a prática de atos
de administração e atos de mero expediente sem caráter
decisório"(...).
Leio agora, Senhor Presidente, até porque é ato de Vossa Excelência,
Ministro Gilmar Mendes , quando foi Presidente deste Supremo Tribunal
Federal:
"RESOLUÇÃO Nº 384, DE 17 DE NOVEMBRO DE 2008
Institui e altera procedimentos para prática de atos
processuais no âmbito da Secretaria do Tribunal.
O PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL,
no uso das atribuições que lhe confere o art. 363, I, do
Regimento Interno, e tendo em vista o decidido na Sessão
Administrativa de 30 de outubro de 2008 sobre o Processo nº
332.652,
R E S O L V E:
Art. 1º A Secretaria Judiciária - SEJ juntará aos processos
ou autos, independentemente de despacho, as petições
apresentadas, ressalvada orientação diversa do Relator."
3
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.RICARDOLEWANDOWSKI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 35 de 56 1783
INQ 3998 AGR / DF
Ela foi juntada aos autos. Eu tive acesso como vistor. Liberei o voto.
Formulei meu voto com base no que havia nos autos, por delegação de
determinação da sessão administrativa e de resolução desta Corte,
fundamentada na Constituição Federal. Aí, a defesa pede acesso àquilo.
Não só a defesa não tem acesso, como se desentranha dos autos! É quase
como um reformatio in pejus , se fosse algo decisório.
Com a devida vênia, penso que está - e esteve, sim - juntada aos
autos, por fundamento constitucional - inciso XIV do art. 93 -, que
permite essa delegação. Essa delegação foi feita por ato do Ministro
Gilmar Mendes , por deliberação; ato executivo de uma deliberação, em
sessão administrativa, do Colegiado da Corte, administrativamente,
dando cumprimento à Constituição.
Então, isso não foi um nada jurídico para esse vistor, com a devida
vênia.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Impactado
por esses argumentos, ainda que haja uma autorização para que a
Secretaria Judiciária pratique atos de mero expediente, esses atos são
praticados, segundo a expressão latina," si et in quantum ", ou seja, em
caráter absolutamente provisório. O que que ela faz? Com aquela massa
de papel, ela precisa juntar mesmo esses documentos aos autos, ou
anexar, não digo juntar, a juntada é um termo técnico jurídico que
significa que a autoridade que ordena o processo - no caso, um Juiz ou
um Ministro de uma Corte ou um Desembargador de um Tribunal
Regional - precisa dar.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Mas, Ministro Lewandowski , eu sou o vistor, eu estou com a vista
do processo, eu tive acesso. Agora, vai se desentranhar?
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Mas ele
não estava entranhado, data venia. Ele devia estar anexado à contracapa
para que pudesse integrar os autos.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Leia o andamento! Eu agi com a maior lealdade; encaminhei ao
Relator para que analisasse o pedido de vista da defesa; e o que se tem é o
4
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.RICARDOLEWANDOWSKI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 36 de 56 1784
INQ 3998 AGR / DF
desentranhamento.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Vossa
Excelência, com o zelo que lhe é próprio, estudou minuciosamente todos
os documentos, inclusive este.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Então, Vossa Excelência está com um processo de vista meu, vou
determinar o desentranhamento de uma série de documentos que foram
entranhados pela secretaria?
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Mas
acontece que este documento só poderia ser validamente examinado e
considerado no voto de Vossa Excelência, salvo melhor juízo e com o
devido respeito e acatamento, depois do pronunciamento do Relator,
autorizando, ou não, a permanência desse documento nos autos. Por
enquanto era um documento que a Secretaria anexou, digamos assim,
para não usar o termo técnico juntada.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Eu li a Constituição e a Resolução;
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Eu estou
dando a minha interpretação do Regimento! Eu estou votando no sentido
de indeferir o agravo regimental nos termos do Relator, data venia.
5
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.GILMARMENDES
Inteiro Teor do Acórdão - Página 37 de 56 1785
04/04/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
VOTO
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES
(PRESIDENTE) - Eu peço vênia ao Ministro Fachin e ao Ministro
Lewandowski, para acompanhar o voto do Ministro Toffoli. Também
entendo que aqui temos uma situação assaz delicada. Houve o
entranhamento desses documentos nos autos. Houve o pedido da defesa,
no sentido de que se lhe desse vista. E o vistor, cuidadosamente, houve
por bem ouvir o Relator. Essa é a situação que se descreve. O Relator,
então, determinou o desentranhamento dos autos.
Parece-me, a mim, que, neste caso, temos sérias
questões ligadas ao direito de defesa, sem fazer referência às
consequências do documento que são levadas em conta na afirmação da
defesa, o seu significado, a sua repercussão no eventual recebimento da
denúncia.
Portanto, também acompanho o eminente Ministro
Toffoli e provejo o agravo.
Supremo Tribunal Federal
Observação
Inteiro Teor do Acórdão - Página 38 de 56 1786
04/04/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
OBSERVAÇÃO
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Ministro
Gilmar, eu queria apenas manifestar uma perplexidade, mas com toda a
humildade que deve caracterizar o julgador. Se esse documento foi
desentranhado, vai se dar vista dos autos a quê? A algo que já não existe
mais? Ou estão reentranhando os autos?
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Eu votei pelo provimento do agravo.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Para
reentranhar aos autos esse documento?
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) - Para
incorporar aos autos.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - O que me
preocupa, então, é que o Ministério Público, quer dizer, depois de
oferecida a denúncia, fora da fase probatória, busca reforçar essa
denúncia com novos documentos? Isso é preocupante. Nós estamos
abrindo uma exceção.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Não, o que eu penso é que o Ministério Público assumiu um
compromisso com o Relator de que, assim que viessem as respostas por
parte do Senado, ele faria juntar. E ele, assim que recebeu, fez juntar; agiu
com lealdade processual, conforme já se comprometera em ofício anterior
encaminhado ao eminente Relator, na época o Ministro Teori Zavascki .
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Está bem!
Supremo Tribunal Federal
QuestãodeOrdem
Inteiro Teor do Acórdão - Página 39 de 56 1787
04/04/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
QUESTÃO DE ORDEM
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) - Bem,
aqui, nós temos, então, a situação de empate, no que diz respeito a essa
matéria.
Leio, agora, o art. 150, § 3º, do nosso Regimento:
"§ 3º Nos habeas corpus e recursos em matéria criminal, exceto o
recurso extraordinário, havendo empate, prevalecerá a decisão mais
favorável ao paciente ou réu."
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Mas nos
habeas corpus, não é? Não no agravo.
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) - Não;
em recursos em matéria criminal.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
O dispositivo regimental fala em" recursos em matéria ". Inclusive eu,
na Presidência, já apliquei esse dispositivo.
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) - Esse
aqui, inclusive, é um agravo regimental na reclamação criminal.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Foi no caso, salvo engano, do inquérito do Chalita. Foi aplicada essa
decisão. Já há precedente, Drª Cláudia.
A SENHORA CLÁUDIA SAMPAIO MARQUES
(SUBPROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA) - Vossa Excelência
permite ao Ministério Público uma intervenção?
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) - Sim.
A SENHORA CLÁUDIA SAMPAIO MARQUES
(SUBPROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA) - Pelo Ministério
Público, aplica-se o § 1º do art. 150, do Regimento Interno:
Supremo Tribunal Federal
QuestãodeOrdem
Inteiro Teor do Acórdão - Página 40 de 56 1788
INQ 3998 AGR / DF
"§ 1º - Se ocorrer empate, será adiada a decisão até tomar-se o
voto do Ministro que esteve ausente."
Entende o Ministério Público, data venia, Senhor Presidente, que o
caso aqui é de aguardar a vinda do Ministro Celso de Mello, para que
profira voto de desempate.
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) - Eu
estou até com o caso, aqui, é exatamente como eu me lembrava - Segundo
Agravo Regimental na Reclamação 20.132 -, eu era o Relator originário, e
Vossa Excelência ficou como Redator.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Eu que fiquei como Redator. Empatou. E houve a proclamação no
sentido de que - exatamente aplicando a cabeça desse dispositivo -,
havendo empate, prevalece a posição favorável, não só em habeas
corpus , como nos recursos criminais.
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) -Portanto, coloco a questão para Vossas Excelências.
2
Supremo Tribunal Federal
Votos/QuestãodeOrdem
Inteiro Teor do Acórdão - Página 41 de 56 1789
04/04/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
VOTO S/ QUESTÃO DE ORDEM
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (RELATOR) - Senhor
Presidente, com todas as vênias, eu entendo que, nesse caso - a diversos
títulos, inclusive a título de, pelo menos, uma das possíveis
hermenêuticas dessa regra regimental -, fosse a hipótese de adiar a
decisão e tomar o voto do eminente Ministro Celso de Mello, até pelo
relevo que possui a decisão.
Ademais, o § 3º refere-se a paciente ou réu. Aqui não há réu - ainda,
nesta fase, tecnicamente falando - e não se trata de habeas. Portanto, não
estamos diante de paciente. É o caso de agravo regimental. Porém, é uma
das interpretações possíveis que esse dispositivo do § 3º do art. 150
permite ter - como essa que Vossa Excelência, também, agora, acaba de
fazer. Entretanto, porque é possível a interpretação nessa direção da
incidência do § 1º do art. 150, creio que o voto do Ministro Celso - num,
ou noutro sentido - poderia dar uma grande contribuição ao desate dessa
matéria, que foi objeto de um bom debate, de um importante debate, e,
então, formar-se uma maioria na Turma.
Supremo Tribunal Federal
Votos/QuestãodeOrdem
Inteiro Teor do Acórdão - Página 42 de 56 1790
04/04/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
VOTO S/ QUESTÃO DE ORDEM
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
No Plenário, eu tenho sempre me colocado favorável a que se
aguarde, se possível, o eminente Colega que esteja ausente. Não me
oponho.
Agora, de qualquer sorte, é aquela história: o prazo dado à defesa,
talvez, tivesse feito andar mais rápido o processo; mas são coisas da vida
formal e processual.
Supremo Tribunal Federal
Votos/QuestãodeOrdem
Inteiro Teor do Acórdão - Página 43 de 56 1791
04/04/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
VOTO S/ QUESTÃO DE ORDEM
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Eu
também vejo que essa norma permite várias interpretações. Não há
prejuízo. Não há prescrição à vista.
A opinião do Decano seria sempre bem-vinda. E até imagino que,
diante de argumentos tão fortes, como foram os esgrimidos de lado a
lado, tirando os meus modestos que enunciei, penso que a posição do
Decano seria uma posição que robusteceria esse debate.
Supremo Tribunal Federal
Esclarecimento
Inteiro Teor do Acórdão - Página 44 de 56 1792
04/04/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
ESCLARECIMENTO
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Senhor
Presidente, à parte deste julgamento, vejam Vossas Excelências a
importância de nós disciplinarmos, com mais verticalidade, a ação da
Secretaria Judiciária. Quer dizer, se nós admitirmos que se permita que a
Secretaria Judiciária, substituindo-se ao magistrado que preside o feito,
na qualidade de Relator, entranhe ou desentranhe documentos ou dê
andamentos, à guisa de decidir, com base em mero expediente, realmente
nós podemos nos defrontar com situações como essas que tomam um
tempo, a meu ver, muito grande de um Colegiado, que tem coisas, claro,
importantes para julgar - e essa é uma questão que envolve direito de
defesa -, mas, no fundo, nós estamos aqui discutindo até que ponto a
Secretaria Judiciária pode tomar decisão que apresenta este relevo sem
submeter ao Relator. Porém, era apenas uma observação a latere que
gostaria de fazer.
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) - E
também nós estamos aqui confrontados com dados fáticos. O fato é que
houve a juntada e que essa matéria foi ao vistor, que passou a examinar o
tema...
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Liberei o voto, e agora me tiram as provas dos autos, com a devida
vênia.
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) - Então,
esse é o dado da vida que nós temos que considerar a partir...
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Sempre temos que ter uma lealdade entre nós.
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (RELATOR) - É o
caminho por onde tenho me postado, aliás, seguindo exemplo de Vossa
Excelência.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Supremo Tribunal Federal
Esclarecimento
Inteiro Teor do Acórdão - Página 45 de 56 1793
INQ 3998 AGR / DF
Porque eu encaminhei o voto. Depois, o processo veio liberado para
pauta, sem que o voto-vista, que é o meu, o tenha feito.
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) - E só
para lembrar aqui, estou vendo também nas pesquisas, que nós temos um
outro caso, Inquérito 3.670, da Segunda Turma, em que houve empate na
denúncia, e aqui não tínhamos nem réu, nem paciente, e se considerou,
portanto, mais favorável na linha daquilo que eu já dispus, mas vamos
aguardar.
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (RELATOR) - Uma
derradeira palavra, se Vossa Excelência permite, sobre a questão da
Secretaria Judiciária, que o eminente Ministro Lewandowski acaba de
expor.
Creio que, aqui, in medio virtu, sempre pode ser um bom
encaminhamento porque, ao mesmo tempo, todos nós, em nossos
Gabinetes, estamos também recheados de trabalho.
E essa expressão" do mero expediente ", condicionada, Ministro
Lewandowski, ao significado do significante" mero expediente ", eu creio
que a Secretaria acaba dando uma boa contribuição a todos nós e ao
Ministro-Relator. Claro, que não está na incumbência deferi ou indeferi
prova, nem jamais se imaginaria isso, mas acho que, encontrando esse
equilíbrio, creio que poderá prestar - como tem prestado, aliás - um bom
serviço a todos nós.
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) -Portanto, definido que fica suspenso o julgamento; fica suspenso também
o julgamento do inquérito, a vista.
Acho que todos estão de acordo em relação a isso.
2
Supremo Tribunal Federal
ExtratodeAta-04/04/2017
Inteiro Teor do Acórdão - Página 46 de 56 1794
SEGUNDA TURMA EXTRATO DE ATA
PROCED. : DISTRITO FEDERAL RELATOR : MIN. EDSON FACHIN
AGTE.(S) : EDUARDO HENRIQUE DA FONTE DE ALBUQUERQUE SILVA
ADV.(A/S) : HAMILTON CARVALHIDO E OUTRO (S) (DF034803/) E
OUTRO (A/S)
ADV.(A/S) : RAFAEL DE ALENCAR ARARIPE CARNEIRO (00025120/DF) E
OUTRO (A/S)
AGDO.(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
Decisão : Após os votos do Relator e do Ministro Ricardo
Lewandowski, no sentido de negar provimento ao agravo regimental e
continuar o julgamento, e dos votos dos Ministros Dias Toffoli e
Gilmar Mendes, que proviam parcialmente o agravo para converter o
julgamento em diligência e determinar a reinserção da petição e
dos documentos da Procuradoria Geral da República já
desentranhados, bem como posteriormente ser conferida vista à
defesa para, querendo, manifestar-se sobre eles no prazo de cinco
dias contados da ciência da sua juntada aos autos, o julgamento
foi suspenso a fim de se aguardar o voto de desempate do Ministro
Celso de Mello. de Mello. Presidência Ausente, do justificadamente, Senhor Ministro Gilmar o Senhor Mendes. Ministro 2ª Turma Celso ,
4.4.2017.
Presidência do Senhor Ministro Gilmar Mendes. Presentes à
sessão os Senhores Ministros Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e
Edson Fachin. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Celso
de Mello.
Subprocuradora-Geral da República, Dra. Cláudia Sampaio
Marques.
Ravena Siqueira
Secretária
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.CELSODEMELLO
Inteiro Teor do Acórdão - Página 47 de 56 1795
08/08/2017 SEGUNDA TURMA
AG.REG. NO INQUÉRITO 3.998 DISTRITO FEDERAL
V O T O
O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Na sessão ordinária
desta Segunda Turma realizada em 04/04/2017, registrou-se empate na
apreciação do presente “agravo regimental”, havendo sido suspenso o
julgamento para aguardar o voto de desempate, a ser por mim proferido.
Sendo esse o contexto, passo , desde logo, ao exame do recurso deduzido
pelo acusado, ora agravante.
É certo que o acusado não é, nem constitui, simples objeto de
persecução penal, pois esta Corte Suprema tem-lhe reconhecido a
condição indisputável de sujeito de direitos e de garantias ( HC 73.271/SP ,
Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), inclusive na fase pré-processual da
“persecutio criminis”, eis que a unilateralidade dos procedimentos estatais
investigatórios não tem o condão de afastar a incidência das
prerrogativas de índole constitucional que amparam qualquer pessoa sob
investigação do Estado ( RTJ 176/805-806 – HC 96.219-MC/SP , Rel. Min.
CELSO DE MELLO, v.g. ).
Nesse contexto , a preservação e o reconhecimento dos direitos
fundamentais daqueles que sofrem persecução penal por parte do Estado
devem compor , por tratar-se de questão impregnada do mais alto relevo,
a agenda permanente desta Corte Suprema, incumbida , por efeito de sua
destinação institucional, de velar pela supremacia da Constituição e de zelar
pelo respeito aos direitos que encontram fundamento legitimador no
próprio estatuto constitucional e nas leis da República.
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.CELSODEMELLO
Inteiro Teor do Acórdão - Página 48 de 56 1796
INQ 3998 AGR / DF
É por essa razão que o processo penal condenatório não constitui
instrumento de arbítrio do Estado. Ao contrário, ele representa poderoso
meio de contenção e de delimitação dos poderes de que dispõem os órgãos
incumbidos da persecução penal. Não exagero ao ressaltar a decisiva
importância do processo penal no contexto das liberdades públicas, pois –
insista-se – o Estado, ao delinear um círculo de proteção em torno da
pessoa do réu, faz do processo penal um instrumento que inibe a opressão
judicial e impede o abuso de poder.
Daí , Senhor Presidente, a corretíssima observação do eminente
Professor ROGÉRIO LAURIA TUCCI (“ Direitos e Garantias Individuais
no Processo Penal Brasileiro ”, p. 33/35, item n. 1.4, 2ª ed., 2004, RT), no
sentido de que o processo penal há de ser analisado em sua precípua
condição de “instrumento de preservação da liberdade jurídica do acusado em
geral”, tal como entende , também em preciso magistério, o Professor HÉLIO
TORNAGHI (“ Instituições de Processo Penal ”, vol. 1/75, 2ª ed., 1977,
Saraiva), cuja lição bem destaca a função tutelar do processo penal:
“ A lei processual protege os que são acusados da prática de
infrações penais, impondo normas que devem ser seguidas nos
processos contra eles instaurados e impedindo que eles sejam
entregues ao arbítrio das autoridades processantes.” ( grifei )
Assentadas tais premissas, que reputo importantes ao
desenvolvimento de meu voto, constato que o exame dos autos revela
que a denúncia tem suporte em elementos probatórios aos quais o
acusado, ora agravante, teve pleno acesso , tanto que impugnou ,
extensamente (54 laudas), a pretensão punitiva do Estado deduzida pelo
Ministério Público, valendo-se da oportunidade a que se refere o art. 4º
da Lei nº 8.038/90, que institui fase de contraditório prévio, na qual se torna
lícito ao denunciado a formulação de questões preliminares de índole formal,
bem assim a contestação ao próprio fundo da controvérsia penal.
2
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.CELSODEMELLO
Inteiro Teor do Acórdão - Página 49 de 56 1797
INQ 3998 AGR / DF
Presente referido contexto, tenho para mim que esta Corte, no caso ora
em exame, quando formular , no momento oportuno, juízo positivo ou
negativo de admissibilidade da acusação penal, considerará , para tanto,
única e tão somente, os elementos documentais e os dados probatórios
que o Ministério Público produziu no momento em que ofereceu ,
em 21/06/2016 (fls. 1.293/1.334), a denúncia em questão e aos quais –
insista-se – o denunciado , então teve integral acesso , deles havendo tido
conhecimento prévio, o que lhe possibilitou comportamento ativo na
elaboração e na condução de sua defesa, tanto que propugnou não só
pela rejeição da denúncia como , até mesmo, indo além , pleiteou a própria
declaração de improcedência da acusação, com a consequente absolvição
penal daí resultante.
É de registrar-se , por relevante, que, em situações como a ora em
exame, a pretensão recursal em causa não tem merecido o beneplácito da
jurisprudência desta Corte:
“ DÉCIMA PRELIMINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA.
AUSÊNCIA DE JUNTADA AOS AUTOS, PELO MINISTÉRIO
PÚBLICO, DE DOCUMENTOS REQUISITADOS À POLÍCIA
FEDERAL. DILIGÊNCIA QUE AINDA NÃO ESTAVA
CONCLUÍDA NO MOMENTO DA APRESENTAÇÃO DA
RESPOSTA PELO DENUNCIADO. ACUSAÇÃO COM BASE
EM OUTROS INDÍCIOS. NULIDADE INEXISTENTE.
Não procede a alegação feita pelo 16º acusado, de que teria
ocorrido cerceamento de defesa , em razão de a apresentação da
defesa ter se dado em momento anterior à juntada aos autos de
elementos requisitados à Polícia Federal pelo Ministério
Público Federal . Os documentos eventualmente anexados aos
autos após a apresentação da denúncia não foram levados em
consideração para efeito de formulação da acusação , não
influenciando , assim , no recebimento da peça acusatória .
Servirão , apenas , para instrução da futura ação penal .”
( Inq 2.245/MG , Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA – grifei )
3
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.CELSODEMELLO
Inteiro Teor do Acórdão - Página 50 de 56 1798
INQ 3998 AGR / DF
Cumpre destacar que, no presente caso, a peça acusatória não invoca
nem se apoia nos documentos e registros de áudio, cujo
desentranhamento foi determinado pela decisão ora agravada e da qual o
próprio Ministério Público Federal sequer recorreu, muito embora dele
houvesse emanado a requisição de tais peças documentais ao Senado
Federal ( Ofício PGR nº 72/GTLJ) e , por ele, houvessem sido elas
ulteriormente produzidas nestes autos.
Procede , bem por isso, a esse propósito, a observação do eminente
Ministro EDSON FACHIN, de que destaco o seguinte fragmento :
“ O denunciado , com razão , opôs-se à juntada , por parte
do Procurador-Geral da República , de documentos que
reforçariam o juízo de procedência quanto à instauração do
processo penal , sem que lhe fosse dada oportunidade de
manifestar-se a respeito.
Sustentou , na oportunidade, que tomou ciência da juntada
desses documentos em razão da consulta ao acompanhamento
processual e afirmou que, ‘... do teor de tais informações e
documentos, o Requerente não tem ciência, nem sobre eles pode
manifestar-se, porque não publicada e trazida aos autos depois da
sustentação das partes na sessão do dia 21 de novembro de 2016’
(fls. 1.684).
…...................................................................................................
Em que pese na petição de agravo o acusado ter mudado a
concepção sobre o conteúdo dos documentos juntados pelo Ministério
Público, os quais, depois de desentranhados , entende que favorecem
os interesses da defesa, enquanto que anteriormente alegava não
ter tido acesso a eles , de fato , não pode o Ministério Público ,
sem aditar a denúncia , reforçar o conjunto probatório após ter
o denunciado oferecido sua resposta à acusação nos termos do
…...................................................................................................
Como ressaltado na decisão recorrida, ao oferecer a
denúncia, o Ministério Público formula sua ‘opinio delicti’ e a
4
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.CELSODEMELLO
Inteiro Teor do Acórdão - Página 51 de 56 1799
INQ 3998 AGR / DF
apresenta ao Poder Judiciário para controle, cabendo a este último
acatar a acusação, instaurando o processo penal, ou rejeitar a
denúncia.
Esta Suprema Corte já decidiu , por sua composição plenária,
que o momento do oferecimento da denúncia é providência que
se situa no âmbito da prerrogativa do Ministério Público , o
qual , todavia , arcará com o ônus da rejeição da peça
acusatória , por falta de justa causa , caso proceda com
açodamento e ofereça denúncia antes de dispor de elementos
probatórios suficientes à configuração dos necessários indícios
de autoria e materialidade .
…...................................................................................................
Sendo assim , a prerrogativa de decidir qual o melhor
momento para a propositura da ação penal não exonera o
Ministério Público do ônus , no momento em que deduz a
pretensão acusatória , de embasar a denúncia em elementos
probatórios capazes de configurar indícios de materialidade e
autoria delitivas suficientes à configuração da justa causa .
Ainda , caso os elementos juntados com a acusação não se
apresentem hígidos , não só do ponto de vista da robustez
probatória , mas também do ponto de vista do comportamento
processual do Ministério Público, que eventualmente pode por em
xeque o eficaz exercício do direito de defesa por parte do acusado, o
caminho natural é a rejeição da denúncia .” ( grifei )
Impende ressaltar , ainda, na linha da advertência contida no voto
do eminente Relator, notadamente no último parágrafo acima reproduzido,
que a jurisprudência desta Corte tem salientado que a insuficiência de
elementos probatórios ou de dados informativos mínimos inviabiliza , por
completo, a acusação penal, obstando-lhe a própria admissibilidade para
efeito de legítima instauração do processo penal condenatório
( RTJ 182/462).
O controle prévio de admissibilidade do recebimento da denúncia – que
reclama o exame da adequação típica do comportamento atribuído aos
5
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.CELSODEMELLO
Inteiro Teor do Acórdão - Página 52 de 56 1800
INQ 3998 AGR / DF
acusados em geral – também exige a constatação, ainda que em sede de
cognição incompleta, da existência, ou não, de elementos de convicção
mínimos que possam autorizar a abertura do procedimento judicial de
persecução penal.
Daí a advertência , Senhor Presidente, fundada no magistério
jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, que cumpre jamais
desconsiderar :
“A imputação penal não pode ser o resultado da vontade
pessoal e arbitrária do acusador. O Ministério Público, para
validamente formular a denúncia penal, deve ter por suporte uma
necessária base empírica, a fim de que o exercício desse grave
dever-poder não se transforme em um instrumento de injusta
persecução estatal. O ajuizamento da ação penal condenatória supõe a
existência de justa causa , que se tem por inocorrente quando o
comportamento atribuído ao réu ‘ nem mesmo em tese constitui
crime, ou quando , configurando uma infração penal, resulta de
pura criação mental da acusação’ ( RF 150/393, Rel. Min.
OROSIMBO NONATO).”
( RTJ 165/877-878 , Rel. Min. CELSO DE MELLO)
Dentro desse contexto, e para efeito de recebimento da denúncia, assume
relevo indiscutível o encargo processual que, ao incidir sobre o órgão de
acusação penal, impõe-lhe o ônus de descrever com precisão e de
demonstrar, ainda que superficialmente, os fatos constitutivos sobre os
quais se assenta a pretensão punitiva do Estado, mediante referência –
insista-se – a elementos mínimos de informação, tal como o exige a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal ( RTJ 182/462).
Essencial , portanto, que se verifique a existência de dados de convicção
que, ao sugerirem a possível ocorrência dos fatos narrados na peça
acusatória, indicam a viabilidade da acusação penal, o que significa
registrar-se a presença de um vínculo informativo minimamente
necessário para sustentar , de modo consistente, a denúncia .
6
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.CELSODEMELLO
Inteiro Teor do Acórdão - Página 53 de 56 1801
INQ 3998 AGR / DF
É importante reconhecer , portanto, para efeito de controle prévio de
admissibilidade da denúncia, que a formulação de acusação penal, para
efetivar-se legitimamente, deverá apoiar-se não em fundamentos
retóricos , mas, sim , em elementos que, instruindo a denúncia, indiquem
a realidade material do delito e apontem para a existência de indícios ,
ainda que mínimos, de autoria ( RTJ 76/741 , Rel. Min. CUNHA PEIXOTO –
RTJ 168/896-897 , Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).
Cumpre ter presente , no ponto, que a formulação da acusação penal
em juízo supõe não a prova completa e integral do delito e de seu autor
(o que somente se revelará exigível para efeito de eventual condenação
penal), mas a demonstração – fundada em elementos probatórios mínimos e
lícitos – da realidade material do evento delituoso e da existência de
indícios de sua possível autoria:
“ Inquérito. Queixa-crime . Alegações desapoiadas de
indícios ou suspeitas fundadas . Juízo de delibação . Condição
de procedibilidade (inexistência). Inviabilidade . Rejeição da
queixa-crime e arquivamento do inquérito.”
( Inq 112/SP , Rel. Min. RAFAEL MAYER – grifei )
“ Queixa-crime .
– Tratando-se de ação penal privada , sua análise, na fase de
recebimento ou não dela, se circunscreve ao crime que é apontado na
queixa como praticado pelo querelado.
– No caso, (...) há falta de justa causa para o oferecimento da
queixa-crime por estar inteiramente desacompanhada de
qualquer elemento, mínimo que seja , de prova sobre a
materialidade do crime, baseando-se o seu oferecimento tão-só na
versão do querelante (…).
Queixa-crime que se rejeita por falta de justa causa.”
( RTJ 182/462 , Rel. Min. MOREIRA ALVES – grifei )
“‘HABEAS CORPUS’ – MINISTÉRIO PÚBLICO –
OFERECIMENTO DE DENÚNCIA – DESNECESSIDADE DE
7
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.CELSODEMELLO
Inteiro Teor do Acórdão - Página 54 de 56 1802
INQ 3998 AGR / DF
PRÉVIA INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL –
EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS MÍNIMOS DE INFORMAÇÃO
QUE POSSIBILITAM O IMEDIATO AJUIZAMENTO DA
AÇÃO PENAL – INOCORRÊNCIA DE SITUAÇÃO DE
INJUSTO CONSTRANGIMENTO – PEDIDO INDEFERIDO .
– O inquérito policial não constitui pressuposto legitimador da
válida instauração, pelo Ministério Público , da ‘persecutio
criminis in judicio’. Precedentes .
O Ministério Público , por isso mesmo, para oferecer
denúncia, não depende de prévias investigações penais promovidas
pela Polícia Judiciária, desde que disponha , para tanto, de
elementos mínimos de informação, fundados em base empírica
idônea, sob pena de o desempenho da gravíssima prerrogativa de
acusar transformar-se em exercício irresponsável de poder,
convertendo , o processo penal, em inaceitável instrumento de
arbítrio estatal. Precedentes .”
( HC 80.405/SP , Rel. Min. CELSO DE MELLO)
“ Denúncia – Recebimento – Suficiência da fundada
suspeita da autoria e prova da materialidade dos fatos –
Inteligência do art. 43 do CPP.
Para o recebimento da denúncia, é desnecessária a prova
completa e taxativa da ocorrência do crime e de seu autor,
bastando a fundada suspeita de autoria e a prova da
materialidade dos fatos.”
( RT 671/312 , Rel. Des. LUIZ BETANHO – grifei )
De qualquer maneira, e tal como corretamente assinalado pelo
eminente Ministro EDSON FACHIN, eventual falha do Ministério Público
na indicação ( e produção ) de elementos probatórios idôneos, cuja ausência
revele , ante a insuficiência de dados informativos, a debilidade da peça
acusatória, ensejará , como direto efeito consequencial, a própria rejeição da
denúncia, por descumprimento de ônus que – imputável ao “Parquet” –
somente a ele incumbe atender.
8
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.CELSODEMELLO
Inteiro Teor do Acórdão - Página 55 de 56 1803
INQ 3998 AGR / DF
Enfatize-se , finalmente, que a advertência feita pelo eminente
Ministro Relator – de que a ausência ou a insuficiência de elementos
probatórios mínimos pode conduzir à rejeição da denúncia, por falta de
justa causa – tem inteiro amparo na jurisprudência dos Tribunais em
geral ( RT 664/336 – RT 716/502 – RT 738/557 – RSTJ 65/157 –
RSTJ 106/426, v.g.) e , também, no magistério da doutrina (DAMÁSIO
E. DE JESUS, “ Código de Processo Penal Anotado ”, p. 07, 17ª ed., 2000,
Saraiva; FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO, “ Código de
Processo Penal Comentado ”, vol. I/111, 4ª ed., 1999, Saraiva; JULIO
FABBRINI MIRABETE, “ Código de Processo Penal Interpretado ”, p. 111,
item n. 12.1, 7ª ed., 2000, Atlas; EDUARDO ESPÍNOLA FILHO, “ Código
de Processo Penal Brasileiro Anotado ”, vol. I/288, 2000, Bookseller, v.g.).
Sendo assim , pedindo vênia aos eminentes Ministros DIAS TOFFOLI
e GILMAR MENDES, acompanho o substancioso voto proferido pelo
eminente Relator, para negar provimento ao presente “agravo regimental”.
É o meu voto .
9
Supremo Tribunal Federal
ExtratodeAta-08/08/2017
Inteiro Teor do Acórdão - Página 56 de 56 1804
SEGUNDA TURMA EXTRATO DE ATA
PROCED. : DISTRITO FEDERAL RELATOR : MIN. EDSON FACHIN
AGTE.(S) : EDUARDO HENRIQUE DA FONTE DE ALBUQUERQUE SILVA
ADV.(A/S) : HAMILTON CARVALHIDO E OUTRO (S) (DF034803/) E
OUTRO (A/S)
ADV.(A/S) : RAFAEL DE ALENCAR ARARIPE CARNEIRO (00025120/DF) E
OUTRO (A/S)
AGDO.(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
Decisão : Após os votos do Relator e do Ministro Ricardo
Lewandowski, no sentido de negar provimento ao agravo regimental e
continuar o julgamento, e dos votos dos Ministros Dias Toffoli e
Gilmar Mendes, que proviam parcialmente o agravo para converter o
julgamento em diligência e determinar a reinserção da petição e
dos documentos da Procuradoria Geral da República já
desentranhados, bem como posteriormente ser conferida vista à
defesa para, querendo, manifestar-se sobre eles no prazo de cinco
dias contados da ciência da sua juntada aos autos, o julgamento
foi suspenso a fim de se aguardar o voto de desempate do Ministro
Celso de Mello. de Mello. Presidência Ausente, do justificadamente, Senhor Ministro Gilmar o Senhor Mendes. Ministro 2ª Turma Celso ,
4.4.2017.
Decisão : A Turma, por maioria, negou provimento ao agravo
regimental, permitindo a continuidade do julgamento, nos termos do
voto Mendes. Presidência do Ministro Edson Fachin. do Relator, vencidos os Ministros Dias 2ª Turma Toffoli , 8.8.2017. e Gilmar
Presidência do Senhor Ministro Edson Fachin. Presentes à
sessão os Senhores Ministros Celso de Mello, Gilmar Mendes,
Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli.
Subprocuradora-Geral da República, Dra. Cláudia Sampaio
Marques.
Ravena Siqueira
Secretária