25 de Junho de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Processo
Órgão Julgador
Partes
Publicação
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
Supremo Tribunal Federal
EmentaeAcórdão
Inteiro Teor do Acórdão - Página 1 de 10
20/08/2014 PLENÁRIO
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 1.158 AMAZONAS
RELATOR : MIN. DIAS TOFFOLI
REQTE.(S) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
INTDO.(A/S) : GOVERNADOR DO ESTADO DO AMAZONAS
INTDO.(A/S) : ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO
AMAZONAS
EMENTA
Ação direta de inconstitucionalidade. Lei do Estado do Amazonas que estende aos servidores inativos adicional de férias. Interpretação das normas constitucionais. Concessão de benefício sem a correspondente causa geradora. Paridade remuneratória. Inexistência de vinculação absoluta. Procedência da ação.
1. Férias, tal como comumente se entende, é período de repouso a que faz jus o trabalhador quando completa certo período laboral, com a finalidade de promover-lhe o convalescimento do cansaço físico e mental decorrente da atividade realizada. Não há margem interpretativa no texto constitucional para que se conceba a extensão de benefício remuneratório desatrelado de qualquer fundamento. O trabalhador aposentado, ou, no caso, o servidor público em inatividade, não pode gozar férias, porquanto já deixou de exercer cargo ou função pública. Nesse passo, afigura-se inviável o deferimento de benefício sem a correspondente causa geradora.
2. A cláusula de extensão aos servidores inativos dos benefícios e vantagens que venham a ser concedidos aos servidores em atividade não autoriza a concessão de vantagens pecuniárias compatíveis tão somente com o regime jurídico dos servidores em atividade. Precedentes: ADI nº 3.783/RO, Rel. Min. Gilmar Mendes , DJe de 6/6/11; ADI nº 575/PI, Rel. Min. Sepúlveda Pertence , DJ de 25/6/99; ADI nº 778, Rel. Min. Paulo Brossard , DJ de 19/12/94. Há direitos do servidor público que não se compatibilizam com o fato da inatividade, não se convertendo o direito de paridade de vencimentos e proventos em sinônimo de absoluta
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igualdade remuneratória. É exatamente esse o caso do adicional de férias.
3. Ação julgada procedente.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, sob a presidência do Senhor Ministro Ricardo Lewandowski, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos e nos termos do voto do Relator, em julgar procedente a ação direta.
Brasília, 20 de agosto de 2014.
MINISTRO DIAS TOFFOLI
Relator
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Relatório
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20/08/2014 PLENÁRIO
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 1.158 AMAZONAS
RELATOR : MIN. DIAS TOFFOLI
REQTE.(S) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
INTDO.(A/S) : GOVERNADOR DO ESTADO DO AMAZONAS
INTDO.(A/S) : ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO
AMAZONAS
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI (RELATOR):
Cuida-se de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Procurador-Geral da República, em 8 de novembro de 1994, em face do § 2º do art. 9º da Lei nº 1.897/1989 do Estado do Amazonas, o qual estende aos servidores inativos estaduais o adicional de férias, correspondente a um terço da remuneração mensal do servidor. Eis o teor do dispositivo questionado:
“Art. 9º - Será concedido ao funcionário público estadual em efetivo exercício, o valor correspondente a um terço da remuneração, no mês em que entrar no gozo de suas férias anuais.
(...)
§ 2º - A vantagem de que trata este artigo será paga aos inativos, de uma só vez, no mês de dezembro.”
Afirma o autor que a propositura da ação atende à representação do Ministério Público do Estado do Amazonas, por considerar que a vantagem prevista no dispositivo impugnado, por sua própria natureza, é insuscetível de extensão aos inativos, não se compreendendo no alcance do art. 40, § 4º, da Constituição Federal, que se aplica apenas às vantagens de caráter permanente. Sustenta, ainda, que
“[o] art. 40 da Constituição Federal, com efeito, ao dispor
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que a aposentadoria deve ser concedida com proventos integrais ou proporcionais, torna claro que esses proventos deverão ser obtidos de acordo com os vencimentos e as vantagens pecuniárias de caráter permanente suscetíveis de incorporação.
Fixado o valor dos proventos, estes só podem sofrer modificação nas hipóteses previstas no § 4º do citado art. 40 da Constituição Federal. Os benefícios e vantagens concedidos aos servidores em atividade podem ser estendidos aos inativos apenas quando incorporáveis aos vencimentos daqueles. Se a gratificação de férias não pode servir de base para a determinação dos proventos, sem afronta ao art. 40 da Lei Maior, como admitir que seja atribuída aos servidores que se encontram na inatividade e, portanto, que não se desfrutam do benefício?”
Em sessão de 18/12/94, o Plenário da Corte deferiu, por maioria, o pedido de medida liminar para suspender, até a decisão final da ação, a eficácia do § 2º do art. 9º da Lei nº 1.897/89 do Estado do Amazonas. O acórdão em questão restou assim ementado:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI ESTADUAL QUE CONCEDE GRATIFICAÇÃO DE FÉRIAS (1/3 DA REMUNERAÇÃO) A SERVIDORES INATIVOS -VANTAGEM PECUNIÁRIA IRRAZOAVEL E DESTITUÍDA DE CAUSA - LIMINAR DEFERIDA.
- A norma legal, que concede a servidor inativo gratificação de férias correspondente a um terço (1/3) do valor da remuneração mensal, ofende o critério da razoabilidade que atua, enquanto projeção concretizadora da cláusula do ‘substantive due process of law’, como insuperável limitação ao poder normativo do Estado.
Incide o legislador comum em desvio ético-jurídico, quando concede a agentes estatais determinada vantagem pecuniária cuja razão de ser se revela absolutamente destituída de causa” (fl. 67).
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A Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas (fls. 45/47) defendeu a constitucionalidade da norma, haja vista a previsão do adicional no art. 7º, XVII, da Constituição Federal, cujo pagamento foi assegurado aos servidores públicos ativos (art. 39, § 2º, da CF/88) e inativos (art. 40 da CF/88).
O Governador amazonense (fls. 79/84) sustentou a inexistência de ofensa ao art. 40, § 4º, da Constituição Federal.
O Advogado-Geral da União, em defesa do ato impugnado, manifestou-se pela improcedência do pleito (fls. 87/92).
O parecer ministerial (fls. 95/100) foi pela procedência da ação, in verbis :
“São férias remuneradas uma conquista do trabalhador, prevista em norma constitucional ( CF, art. 7º, XVII), e estendida
os servidores públicos através do § 2º do artigo 39 da Constituição Federal. Mas, como é óbvio, para cada ano de trabalho o servidor tem direito ao repouso anual remunerado. Logo, o aposentado não faz jus às férias remuneradas e, muito menos ao terço previsto no dispositivo impugnado” (fl. 98).
Em atendimento ao despacho de fl. 117, informou a Assembleia Legislativo do Estado que o dispositivo atacado permanece em vigor.
É o relatório.
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Voto-MIN.DIASTOFFOLI
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AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 1.158 AMAZONAS
VOTO
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI (RELATOR):
Como relatado, trata-se de ação direta de inconstitucionalidade em que se questiona a validade de norma legal que estende aos servidores inativos do Estado do Amazonas o direito à percepção do adicional de férias, correspondente ao valor de um terço dos proventos.
De início, é importante esclarecer que as modificações promovidas no art. 40, § 4º, da Constituição, com a edição das Emendas Constitucionais nº 20/98 e nº 41/03, não interferem no julgamento da presente ação. A regra da paridade remuneratória persistiu no arcabouço constitucional, ainda que como regra transitória (art. 7º da EC 41/03), garantindo aos aposentados e aos pensionistas a revisão imediata dos valores dos proventos e pensões, de acordo com os vencimentos dos servidores em atividade, se em gozo do benefício na data da publicação da Emenda Constitucional nº 41/03.
Por seu turno, quanto ao mérito, o pleito de declaração de incompatibilidade do dispositivo com a Carta Maior deve ser acolhido, subsistindo as razões do deferimento da medida cautelar.
A concessão de adicional de férias a servidores públicos que, merecidamente, já se aposentaram falece de qualquer sustentação lógica e jurídica.
A interpretação das normas constitucionais, tanto pelo aplicador, quanto pelo legislador, deve observar certos limites hermenêuticos, não se podendo extrair do texto regramento normativo que extrapole as possibilidades do seu conteúdo semântico.
As férias, tal como comumente se entende, são um período de repouso a que faz jus o trabalhador quando completa certo período laboral, com a finalidade de promover-lhe o convalescimento do cansaço físico e mental decorrente das atividades realizadas. Conforme definição
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de Mauricio Godinho Delgado:
“[Férias são] o lapso temporal remunerado, de frequência anual, constituído de diversos dias sequenciais, em que o empregado pode sustar a prestação de serviços e sua disponibilidade perante o empregador, com o objetivo de recuperação e implementação de suas energias e de sua inserção familiar, comunitária e política” ( Curso de direito do trabalho . 6. ed. São Paulo: LTr, 2007. p. 952).
Ora, não há margem interpretativa no texto constitucional para que se conceba a extensão de benefício remuneratório desatrelado de qualquer fundamento. O trabalhador aposentado, ou, no caso, o servidor público em inatividade, não pode gozar férias, porquanto já deixou de exercer cargo ou função pública. Nesse passo, afigura-se inviável o deferimento de benefício sem a correspondente causa geradora.
Como afirmou o Ministro Sepúlveda Pertence quando da concessão da medida cautelar, “a lei questionada remunera férias do aposentado, que, evidentemente, não as tem. Em nome do princípio da moralidade, ou em nome do princípio da igualdade, não se pode conceder remuneração absolutamente despida de causa no serviço público”.
Ademais, a cláusula de extensão aos servidores inativos dos benefícios e vantagens que venham a ser concedidos aos servidores em atividade (art. 40, § 4º, CF) não autoriza a concessão de vantagens pecuniárias compatíveis tão somente com o regime jurídico dos servidores em atividade. Nesse sentido, é possível aplicar ao presente caso a jurisprudência da Corte que diferencia, para fins de extensão aos inativos, os benefícios remuneratórios atrelados à atuação ativa do servidor daqueles caracterizados pela generalidade ou indistinção. Confira-se:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. EXTENSÃO DO AUXÍLIO-MORADIA AOS MEMBROS INATIVOS DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. I.
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INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL . A Lei nº 8.625/1993 – Lei Orgânica Nacional do Ministério Público ( LONMP)–, ao traçar as normas gerais sobre a remuneração no âmbito do Ministério Público, não prevê o pagamento de auxílio-moradia para membros aposentados do parquet. Como a LONMP regula de modo geral as normas referentes aos membros do Ministério Público e não estende o auxílio-moradia aos membros aposentados, conclui-se que o dispositivo em análise viola o art. 127, § 2º, da Carta Magna, pois regula matéria própria da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público e em desacordo com esta. II . INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL. O auxílio moradia constitui vantagem remuneratória de caráter indenizatório. Portanto, é devido apenas em virtude da prestação das atividades institucionais em local distinto, enquanto estas durarem. Como decorre da própria lógica do sistema remuneratório, o auxílio moradia visa ressarcir os custos e reparar os danos porventura causados pelo deslocamento do servidor público para outros locais que não o de sua residência habitual. Dessa forma, parece lógico que tal vantagem seja deferida apenas àqueles servidores em plena atividade, que se encontrem nessa específica situação, e apenas enquanto ela durar, não se incorporando de forma perpétua aos vencimentos funcionais do servidor. O auxíliomoradia deve beneficiar somente o membro do Ministério Público que exerça suas funções em local onde não exista residência oficial condigna. Assim, a extensão de tal vantagem aos membros aposentados, que podem residir em qualquer lugar, visto que seu domicílio não está mais vinculado ao local onde exerçam suas funções ( CF, art. 129, § 2º), viola os princípios constitucionais da isonomia, da razoabilidade e da moralidade. III. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PROCEDENTE” ( ADI nº 3.783/RO, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Gilmar Mendes , DJe de 6/6/11).
“I. Ação direta de inconstitucionalidade: quando a
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prejudica ou não a alteração, no curso do processo, de norma constitucional pertinente à matéria do preceito infraconstitucional impugnado. II. Proventos de aposentadoria: a regra de extensão aos inativos das melhorias da remuneração dos correspondentes servidores em atividade (CF, art. 40, § 8º, cf. EC 20/98) não implica a permanente e absoluta paridade entre proventos e vencimentos, dado que nos últimos se podem incluir vantagens pecuniárias que, por sua natureza, só podem ser atribuídas ao serviço ativo . (...)” ( ADI nº 575/PI, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence , DJ de 25/6/99).
Como assentado pelo Ministro Paulo Brossard na ADI nº 778 (DJ de 19/12/94), “[n]em todos os benefícios concedidos aos servidores em atividade são compatíveis com a situação do aposentado, como é o caso das férias anuais e da gratificação paga ‘durante o exercício’ em locais adversos”. Dessa forma, é evidente, que há direitos do servidor público que não se compatibilizam com o fato da inatividade, não se convertendo o direito de paridade de vencimentos e proventos em sinônimo de absoluta igualdade remuneratória. É exatamente esse o caso do adicional de férias.
Ante o exposto, julgo procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade do art. 9º, § 2º, da Lei nº 1.897/1989 do Estado do Amazonas.
É como voto.
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ExtratodeAta-20/08/2014
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PLENÁRIO EXTRATO DE ATA
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 1.158
PROCED. : AMAZONAS RELATOR : MIN. DIAS TOFFOLI
REQTE.(S) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
INTDO.(A/S) : GOVERNADOR DO ESTADO DO AMAZONAS
INTDO.(A/S) : ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO AMAZONAS
Decisão: O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, julgou procedente a ação direta. Ausentes, justificadamente, o Ministro Celso de Mello e, neste julgamento, o Ministro Gilmar Mendes. Presidiu o julgamento o Ministro Ricardo Lewandowski, Vice-Presidente no exercício da Presidência. Plenário, 20.08.2014.
Presidência do Senhor Ministro Ricardo Lewandowski, Vice-Presidente no exercício da Presidência. Presentes à sessão os Senhores Ministros Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Luiz Fux, Rosa Weber, Teori Zavascki e Roberto Barroso.
Procurador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot Monteiro de Barros.
p/ Fabiane Pereira de Oliveira Duarte
Assessora-Chefe do Plenário