28 de Junho de 2022
- 2º Grau
Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro
Supremo Tribunal Federal STF - HABEAS CORPUS: HC 115795 ES - Inteiro Teor
Detalhes da Jurisprudência
Processo
Órgão Julgador
Partes
Publicação
Julgamento
Relator
Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro
Inteiro Teor
Supremo Tribunal Federal
EmentaeAcórdão
Inteiro Teor do Acórdão - Página 1 de 10
04/06/2013 SEGUNDA TURMA
HABEAS CORPUS 115.795 ESPÍRITO SANTO
RELATOR : MIN. GILMAR MENDES
PACTE.(S) : PAULO SÉRGIO ASSUNÇÃO
IMPTE.(S) : DENNIS SERRÃO ARAUJO MONTEIRO DE CASTRO
COATOR (A/S)(ES) : RELATORA DO HC Nº 258.280 DO SUPERIOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Habeas corpus. 2. Tráfico ilícito de entorpecentes (art. 33, caput, da Lei 11.343/2006). 3. Ausência dos requisitos autorizadores da prisão preventiva. Constrangimento ilegal configurado. Superação da Súmula 691. 4. Excepcionalidade da prisão. Possibilidade da aplicação de outras medidas cautelares. Art. 319 do CPP. 5. Ordem concedida, confirmando a liminar.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a presidência da Senhora Ministra Cármen Lúcia, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade, conceder a ordem e confirmar a liminar deferida, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 4 de junho de 2013.
Ministro GILMAR MENDES
Relator
Documento assinado digitalmente
Supremo Tribunal Federal
Relatório
Inteiro Teor do Acórdão - Página 2 de 10
04/06/2013 SEGUNDA TURMA
HABEAS CORPUS 115.795 ESPÍRITO SANTO
RELATOR : MIN. GILMAR MENDES
PACTE.(S) : PAULO SÉRGIO ASSUNÇÃO
IMPTE.(S) : DENNIS SERRÃO ARAUJO MONTEIRO DE CASTRO
COATOR (A/S)(ES) : RELATORA DO HC Nº 258.280 DO SUPERIOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
R E L A T Ó R I O
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (Relator): Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado por Dennis Serrão Araújo Monteiro de Castro, em favor de Paulo Sérgio Assunção, contra decisão proferida pela Ministra Alderita Ramos de Oliveira (desembargadora convocada do TJ/PE) que, nos autos do HC 258.280/ES do Superior Tribunal de Justiça (STJ), indeferiu o pedido liminar.
Na espécie, Paulo Sérgio Assunção foi preso em flagrante, em 17 de julho de 2012, pela suposta prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, porquanto foram encontradas na posse de Walace Menegati Silva duas buchas de maconha, supostamente adquiridas do paciente.
O Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Iconha/ES converteu, então, a prisão em flagrante em preventiva. Daí, a impetração de habeas corpus no Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, requerendo fosse concedido ao réu o direito de aguardar o julgamento em liberdade.
A Corte estadual denegou a ordem.
Irresignada, a defesa impetrou novo habeas no STJ, que teve o pedido liminar indeferido, nos seguintes termos:
“Não merece acolhida o pedido liminarmente formulado. Cumpre ressaltar, inicialmente, que a concessão de medida liminar, em sede de habeas corpus, é medida que se reveste de caráter excepcional, admitida, assim, tão-somente
Supremo Tribunal Federal
Relatório
Inteiro Teor do Acórdão - Página 3 de 10
quando estiver configurado manifesto constrangimento ilegal ou abuso de poder a cercear a liberdade de locomoção do paciente, o que não se verifica no caso sob exame.
Outrossim, resulta evidente que a medida liminarmente pleiteada, no caso em espécie, confunde-se com o mérito da impetração, revelando, assim, seu caráter satisfativo, o que demonstra, mais uma vez, ser apropriada a análise da questão em tempo oportuno.
Por tais razões, INDEFIRO o pedido de liminar”. (eDOC 2, p. 7-8).
No presente writ, alega constrangimento ilegal ante a ausência de fundamentação idônea do decreto de prisão preventiva, nos termos do art. 312 do CPP.
Aduz, ainda, que a conduta do paciente não apresenta perigo à ordem pública e que a manutenção da prisão preventiva, no caso, viola o princípio da inocência. No mais, alega a existência de excesso de prazo para julgamento.
Requer, liminarmente e no mérito, seja concedida a ordem de habeas corpus determinando a liberdade provisória em favor do paciente.
Em 21.11.2012, superei a Súmula 691 e deferi o pedido liminar para suspender os efeitos da ordem de prisão decretada em desfavor do paciente, sem prejuízo da análise da aplicação de medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP.
A Procuradoria-Geral da República manifestou-se pelo não conhecimento do pedido e, no mérito, pela denegação da ordem, cassando a liminar deferida.
É o relatório.
2
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.GILMARMENDES
Inteiro Teor do Acórdão - Página 4 de 10
04/06/2013 SEGUNDA TURMA
HABEAS CORPUS 115.795 ESPÍRITO SANTO
V O T O
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR): Conforme já relatado, trata-se de habeas corpus contra decisão de indeferimento da medida liminar requerida no bojo do HC n. 258.280/ES do STJ, pela qual buscava a defesa a revogação da prisão preventiva do paciente e, consequentemente, a concessão da liberdade provisória em favor deste.
De início, destaco que a jurisprudência desta Corte é no sentido da inadmissibilidade da impetração de habeas corpus, nas causas de sua competência originária, contra decisão denegatória de liminar em ação de idêntica natureza articulada perante tribunal superior, antes do julgamento definitivo do writ (cf. HC-QO n. 76.347/MS, Min. Moreira Alves, 1ª Turma, unânime, DJ 8.5.1998; HC n. 79.238/RS, Min. Moreira Alves, 1ª Turma, unânime, DJ 6.8.1999; HC n. 79.776/RS, Min. Moreira Alves, 1ª Turma, unânime, DJ 3.3.2000; HC n. 79.775/AP, Min. Maurício Corrêa, 2ª Turma, maioria, DJ 17.3.2000; HC n. 79.748/RJ, Min. Celso de Mello, 2ª Turma, maioria, DJ 23.6.2000; HC n. 101.275/SP, Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, maioria, DJe 5.3.2010; e HC n. 103.195, Min. Cezar Peluso, 2ª Turma, unânime, DJe 23.4.2010).
Esse entendimento está representado na Súmula 691/STF; eis o teor: Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar.
É bem verdade que o rigor na aplicação da Súmula n. 691/STF tem sido abrandado por julgados desta Corte em hipóteses excepcionais em que: a) seja premente a necessidade de concessão do provimento cautelar para evitar flagrante constrangimento ilegal; ou b) a negativa de decisão concessiva de medida liminar pelo tribunal superior importe na
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.GILMARMENDES
Inteiro Teor do Acórdão - Página 5 de 10
caracterização ou na manutenção de situação que seja manifestamente contrária à jurisprudência do STF (cf. as decisões colegiadas: HC n. 84.014/MG, Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, unânime, DJ 25.6.2004; HC n. 85.185/SP, Min. Cezar Peluso, Pleno, por maioria, DJ 1º.9.2006; e HC n. 90.387, da minha relatoria, 2ª Turma, unânime, DJ 28.9.2007).
Na hipótese dos autos, entendo caracterizada situação apta a ensejar o afastamento da Súmula 691/STF.
De um modo geral, a prisão preventiva deve indicar, de forma expressa, os seguintes fundamentos para a sua decretação, nos termos do art. 312 do CPP: I) garantia da ordem pública; II) garantia da ordem econômica; III) garantia da aplicação da lei penal; e IV) conveniência da instrução criminal.
Na linha da jurisprudência deste Tribunal, porém, não basta a mera explicitação textual dos requisitos previstos, sendo necessário que a alegação abstrata ceda à demonstração concreta e firme de que tais condições realizam-se na espécie.
Dessarte, a tarefa de interpretação constitucional para a análise de uma excepcional situação jurídica de constrição da liberdade dos cidadãos exige que a alusão a esses aspectos esteja lastreada em elementos concretos, devidamente explicitados.
Por oportuno, transcrevo os seguintes trechos da decisão que converteu a prisão em flagrante em prisão preventiva:
“Verifica-se que o crime, em tese, praticado pelo indiciado possui pena máxima superior a quatro anos (art. 33 da Lei 11.343/2006), e estão presentes os requisitos do art. 312 do CPP. Vejamos:
Os indícios de autoria no caso em análise são incontestáveis e a materialidade estreme de dúvida, consoante os depoimentos colhidos em sede policial e auto de apreensão e de constatação de substância tóxica (fl. 09).
Necessária, ainda, a prisão cautelar para garantia da ordem pública, vez que o crime pelo qual responde, tráfico de drogas, revela-se como força motriz de outros crimes.
2
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.GILMARMENDES
Inteiro Teor do Acórdão - Página 6 de 10
Ante ao exposto, com fundamento nos arts. 310, II e 312, ambos do Código de Processo Penal, decreto a prisão preventiva de Paulo Sérgio Assunção”.
Pois bem. Na hipótese, o decreto de prisão preventiva baseou-se, quanto à segregação do paciente, na necessidade de se resguardar a ordem pública.
No ponto, destaco que a decisão que decreta a prisão do agente no intuito de resguardar a ordem pública deve demonstrar sólidas evidências do real perigo que a liberdade do indivíduo causaria à sociedade.
Bem analisados os argumentos expendidos pelo Juízo de origem, constato que não há, em nenhum momento, a indicação de fatos concretos que justificam o alegado risco do paciente para a ordem pública, para a tranquilidade e a paz no seio social.
Nesse sentido, a decisão de prisão diverge do firmado por esta Corte: HC 86.758/PR (DJ 1.9.2006), HC 84.997/SP (DJ 8.6.2007) e HC 83.806/SP (DJ 18.6.2004). É que a constrição provisória deve estar embasada em elementos concretos, e não abstratamente, como vazio argumento de retórica.
Tal posicionamento é hoje uníssono nesta Corte, cuja jurisprudência consolidou-se no sentido de entender que a liberdade de um indivíduo suspeito da prática de infração penal somente pode sofrer restrições se houver decisão judicial devidamente fundamentada, amparada em fatos concretos e não apenas em hipóteses ou conjecturas, na gravidade do crime ou em razão de seu caráter hediondo. Nesse sentido arrolo os seguintes julgados: HC 84.662/BA, Rel. Min. Eros Grau, 1ª Turma, unânime, DJ 22.10.2004; HC 86.175/SP, Rel. Min. Eros Grau, 2ª Turma, unânime, DJ 10.11.2006; HC 88.448/RJ, de minha relatoria, 2ª Turma, por empate na votação, DJ 9.3.2007; HC 101244/MG, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, unânime, DJe 8.4.2010.
A perplexidade é ainda maior se analisarmos o decreto de prisão à luz das modificações promovidas ao Código de Processo Penal pela Lei 12.403/2011, que dispõe sobre matérias pertinentes à prisão processual, fiança, liberdade provisória, e demais medidas cautelares.
3
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.GILMARMENDES
Inteiro Teor do Acórdão - Página 7 de 10
Com a entrada em vigor da Lei 12.403/2011, nos termos da nova redação do art. 319 do CPP, o juiz passa a dispor de outras medidas cautelares de natureza pessoal diversas da prisão, permitindo, diante das circunstâncias do caso concreto, seja escolhida a medida mais ajustada às peculiaridades da espécie, permitindo, assim, a tutela do meio social, mas também servindo, mesmo que cautelarmente, de resposta justa e proporcional ao mal supostamente causado pelo acusado.
Feitas essas considerações, reputo que a prisão provisória decretada em desfavor do paciente não atendeu aos requisitos do art. 312 do CPP, especialmente no que diz respeito à indicação de elementos concretos que, ao momento da decretação, fossem imediatamente incidentes a ponto de ensejar o decreto cautelar.
Ademais, na espécie, as condições pessoais do paciente são todas favoráveis (primariedade, residência fixa e trabalho lícito).
Por fim, com relação ao excesso de prazo, entendo não assistir razão à defesa, pois, segundo informações prestadas pelo Juízo de origem, foi designada para o dia 11 de junho de 2013 a audiência de instrução e julgamento.
Ante o exposto, meu voto é no sentido de conceder a ordem de habeas corpus, a fim de que o paciente possa responder ao processo em liberdade, se por algum outro motivo não estiver preso, sem prejuízo da análise da aplicação de medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP.
Nesses termos, voto pela concessão da ordem, confirmando a liminar deferida.
É como voto.
4
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.RICARDOLEWANDOWSKI
Inteiro Teor do Acórdão - Página 8 de 10
04/06/2013 SEGUNDA TURMA
HABEAS CORPUS 115.795 ESPÍRITO SANTO
VOTO
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Senhora Presidente, aqui trata-se da superação da Súmula 691.
Normalmente, nesses casos, eu não conheço, aplico a súmula; mas, aqui, entendo que o Ministro-Relator, data venia, agiu bem, por vários motivos. Primeiramente, eu verifico que o paciente foi preso sob a alegação de traficância, simplesmente porque vendeu duas buchas de maconha. Maconha é um dos entorpecentes mais leves dentro daquela gradação de entorpecentes que nós temos. Então, ele tem, como já foi ressaltado, residência fixa, tem emprego, não tem antecedentes, e a prisão não foi fundamentada nem minimamente.
Refletindo sobre aquilo que o Ministro Gilmar Mendes levantou agora, eu tenho também entendido que o Juiz, ao aplicar a prisão preventiva com fundamento no 312, deve, a meu ver, justificar porque é que ele não está aplicando alguma daquelas providências listadas no artigo 319 - são medidas alternativas à prisão preventiva -, ele deve fundamentar e dizer: Olha, o paciente apresenta periculosidade etc; não são cabíveis ou não são suficientes aquelas medidas do artigo 319. Eu penso que nós temos que criar uma cultura para que o Juiz, agora, diante da reforma do Código de Processo Penal, afaste justificadamente o artigo 309 e aplique também, de forma fundamentada, o artigo 312.
Acompanho, portanto, o Relator, que está conhecendo, concedendo a ordem e confirmando a liminar de soltura.
Supremo Tribunal Federal
Voto-MIN.CÁRMENLÚCIA
Inteiro Teor do Acórdão - Página 9 de 10
04/06/2013 SEGUNDA TURMA
HABEAS CORPUS 115.795 ESPÍRITO SANTO
SEGUNDA TURMA
VOTO
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA (PRESIDENTE) - Eu também, em geral, não supero, a não ser em casos excepcionais, como o que aqui se configura, a Súmula nº 691; mas, neste caso vou superar, em face da precariedade do que afirmado pelo Juiz, qual seja, de que a prisão cautelar, se deu para a garantia da ordem pública, vez que o crime pelo qual responde, tráfico de entorpecentes, revela-se com força motriz de outros crimes, o que se afirma sem qualquer justificativa e sem qualquer análise sobre, no caso concreto.
Então, em caráter excepcional, tendo em vista as peculiaridades do caso, acompanho o Ministro-Relator para conceder a ordem, determinando que o Juiz verifique, se for o caso, a possibilidade de aplicação do artigo 319 na nova norma do Código de Processo Penal.
* * * * *
Supremo Tribunal Federal
ExtratodeAta-04/06/2013
Inteiro Teor do Acórdão - Página 10 de 10
SEGUNDA TURMA EXTRATO DE ATA
PROCED. : ESPÍRITO SANTO RELATOR : MIN. GILMAR MENDES
PACTE.(S) : PAULO SÉRGIO ASSUNÇÃO
IMPTE.(S) : DENNIS SERRÃO ARAUJO MONTEIRO DE CASTRO
COATOR (A/S)(ES) : RELATORA DO HC Nº 258.280 DO SUPERIOR TRIBUNAL
DE JUSTIÇA
Decisão: A Turma, por unanimidade, concedeu a ordem de habeas corpus, a fim de que o paciente possa responder ao processo em liberdade, se por algum outro motivo não estiver preso, sem prejuízo da análise da aplicação de medidas cautelares previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal, confirmando a liminar deferida, justificadamente, nos o termos Senhor do Ministro voto Celso do de Relator. Mello. 2ª Ausente, Turma , 04.06.2013.
Presidência da Senhora Ministra Cármen Lúcia. Presentes à
sessão os Senhores Ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e
Teori Zavascki. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Celso de Mello.
Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco de Assis Vieira Sanseverino.
Ravena Siqueira
Secretária Substituta