16 de Agosto de 2022
- 2º Grau
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Supremo Tribunal Federal STF - RECURSO EXTRAORDINÁRIO: RE XXXXX MG
Publicado por Supremo Tribunal Federal
Detalhes da Jurisprudência
Processo
Partes
Publicação
Julgamento
Relator
Min. DIAS TOFFOLI
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Decisão
Vistos. Ministério Público do Estado de Minas Gerais interpõe recurso extraordinário, com fundamento na alínea a do permissivo constitucional, contra acórdão da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, assim do: Apelação. Ação de alimentos. Ministério Público representando menor sob o pátrio poder familiar. 1. Tratando-se de menores sob a guarda e responsabilidade da genitora, falta legitimidade ao Ministério Público para propor ação de alimentos como substituto processual. 2. A aplicação do art. 201, III, da Lei 8069/90 ( Estatuto da Criança e do Adolescente), só se dá quando houver falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável legal, conforme o art. 98, II, do mesmo diploma legal (folha 49). Opostos embargos de declaração (folhas 56 a 61), foram rejeitados (folhas 63 a 65). Alega o recorrente violação dos artigos 5º, incisos LIV e LV, 127, 129, inciso IX, e 227, da Constituição Federal, por entender possuir legitimidade para a propositura da presente ação. Sem contrarrazões (folha 110), o recurso extraordinário (folhas 90 a 106) foi admitido (folhas 114/115). O Superior Tribunal de Justiça, não conheceu do recurso especial interposto paralelamente ao extraordinário (folhas 136/137), o que ensejou a interposição de agravo regimental pelo Ministério Público Federal (folhas 141 a 159), posteriormente desprovido pela decisão de folhas 161 a 165, da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, cuja ementa assim dispõe: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. MINISTÉRIO PÚBLICO. ILEGITIMIDADE ATIVA. 1. É ilegítima a substituição processual do Ministério Público em ação de alimentos em favor de menor que se encontra sob o pátrio poder da genitora. 2. Agravo regimental desprovido (folha 165). Opostos embargos de declaração (folhas 169 a 181), foram rejeitados (folhas 183 a 186). Irresignado, o Ministério Público Federal interpôs novo recurso extraordinário (folhas 192 a 210), com fundamento na alínea a do artigo 102, inciso III, da Constituição Federal, alegando contrariedade aos artigos 1º, inciso III, 5º, 127, 129, inciso IX, e 227, todos da Constituição Federal, o qual, inadmitido, deu ensejo à interposição de agravo de instrumento. Decido. A Emenda Constitucional nº 45, de 30/12/04, que acrescentou o § 3º ao artigo 102 da Constituição Federal, criou a exigência da demonstração da existência de repercussão geral das questões constitucionais trazidas no recurso extraordinário. A matéria foi regulamentada pela Lei nº 11.418/06, que introduziu os artigos 543-A e 543-B ao Código de Processo Civil, e o Supremo Tribunal Federal, através da Emenda Regimental nº 21/07, dispôs sobre as normas regimentais necessárias à sua execução. Prevê o artigo 323 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, na redação da Emenda Regimental nº 21/07, que, quando não for o caso de inadmissibilidade do recurso extraordinário por outra razão, haverá o procedimento para avaliar a existência de repercussão geral na matéria objeto do recurso. Esta Corte, com fundamento na mencionada legislação, quando do julgamento da Questão de Ordem no Agravo de Instrumento nº 664.567/RS, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, firmou o entendimento de que os recursos extraordinários interpostos contra acórdãos publicados a partir de 3/5/07, data da publicação da Emenda Regimental nº 21/07, deverão demonstrar, em preliminar do recurso, a existência da repercussão geral das questões constitucionais discutidas no apelo. No caso em tela, o recurso extraordinário possui a referida preliminar e o apelo foi interposto contra acórdão publicado em 2/10/7 (folha 66), quando já era plenamente exigível a demonstração da repercussão geral. Os artigos 543-A, § 3º, do Código de Processo Civil e 323, § 1º, in fine, do RISTF, na redação da Emenda Regimental nº 21/07, prevêem que haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar decisão contrária a súmula ou jurisprudência dominante desta Corte, o que, efetivamente, ocorre no caso dos autos. Merece prosperar a irresignação. A partir do julgamento, pelo Plenário desta Corte, do Recurso Extraordinário nº 248.869-1/SP, Relator o Ministro Maurício Corrêa, DJ de 12/3/04, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de admitir a legitimidade do Ministério Público para ajuizar ação de investigação de paternidade, cumulada com pedido de alimentos, em situação similar à retratada neste processo. Tal precedente restou assim ementado: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA AJUIZAR AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. FILIAÇÃO. DIREITO INDISPONÍVEL. INEXISTÊNCIA DE DEFENSORIA PÚBLICA NO ESTADO DE SÃO PAULO. 1. A Constituição Federal adota a família como base da sociedade a ela conferindo proteção do Estado. Assegurar à criança o direito à dignidade, ao respeito e à convivência familiar pressupõe reconhecer seu legítimo direito de saber a verdade sobre sua paternidade, decorrência lógica do direito à filiação ( CF, artigos 226, §§ 3o, 4o, 5o e 7o; 227, § 6o). 2. A Carta Federal outorgou ao Ministério Público a incumbência de promover a defesa dos interesses individuais indisponíveis, podendo, para tanto, exercer outras atribuições prescritas em lei, desde que compatível com sua finalidade institucional ( CF, artigos 127 e 129). 3. O direito ao nome insere-se no conceito de dignidade da pessoa humana e traduz a sua identidade, a origem de sua ancestralidade, o reconhecimento da família, razão pela qual o estado de filiação é direito indisponível, em função do bem comum maior a proteger, derivado da própria força impositiva dos preceitos de ordem pública que regulam a matéria ( Estatuto da Criança e do Adolescente, artigo 27). 4. A Lei 8560/92 expressamente assegurou ao 'Parquet', desde que provocado pelo interessado e diante de evidências positivas, a possibilidade de intentar a ação de investigação de paternidade, legitimação essa decorrente da proteção constitucional conferida à família e à criança, bem como da indisponibilidade legalmente atribuída ao reconhecimento do estado de filiação. Dele decorrem direitos da personalidade e de caráter patrimonial que determinam e justificam a necessária atuação do Ministério Público para assegurar a sua efetividade, sempre em defesa da criança, na hipótese de não reconhecimento voluntário da paternidade ou recusa do suposto pai. 5. O direito à intimidade não pode consagrar a irresponsabilidade paterna, de forma a inviabilizar a imposição ao pai biológico dos deveres resultantes de uma conduta volitiva e passível de gerar vínculos familiares. Essa garantia encontra limite no direito da criança e do Estado em ver reconhecida, se for o caso, a paternidade. 6. O princípio da necessária intervenção do advogado não é absoluto ( CF, artigo 133), dado que a Carta Federal faculta a possibilidade excepcional da lei outorgar o 'jus postulandi' a outras pessoas. Ademais, a substituição processual extraordinária do Ministério Público é legítima ( CF, artigo 129; CPC, artigo 81; Lei 8560/92, artigo 2o, § 4o) e socialmente relevante na defesa dos economicamente pobres, especialmente pela precariedade da assistência jurídica prestada pelas defensorias públicas. 7. Caráter personalíssimo do direito assegurado pela iniciativa da mãe em procurar o Ministério Público visando a propositura da ação. Legitimação excepcional que depende de provocação por quem de direito, como ocorreu no caso concreto. Recurso extraordinário conhecido e provido. Nessa linha de entendimento, importante ressaltar que esta Corte vem proferindo inúmeros julgamentos, de igual teor, o que foi feito nos seguintes processos: RE nº 222.693/MG, Relator o Ministro Cezar Peluso; RE nº 231.704/MG, Relator o Ministro Cezar Peluso; RE nº 244.330/MG, Relator o Ministro Marco Aurélio; RE nº 370.035/SP, Relator o Ministro Joaquim Barbosa; RE nº 522.792/SC, Relator o Ministro Eros Grau e RE nº 541.400/RS, Relator o Ministro Gilmar Mendes e RE nº 634.910/MG,Relator o Ministro Celso de Mello, DJe de 2/12/11, o qual, dada a absoluta similitude com o presente feito, transcrevo, na íntegra: DECISÃO: Trata-se de recurso extraordinário interposto contra acórdão, que, confirmado, em sede de embargos de declaração (fls. 129/132), pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, extinguiu o processo, sem julgamento de mérito, por entender que falece, ao Ministério Público, legitimidade ativa para propor ação de alimentos em favor de menor sujeito ao poder familiar e cujo genitor não disponha de condições financeiras minimamente adequadas. Sustenta-se, nesta sede recursal, que o Tribunal a quo teria transgredido preceitos inscritos na Constituição da Republica. O Ministério Público Federal, em manifestação da lavra do ilustre Subprocurador-Geral da República, Dr. RODRIGO JANOT MONTEIRO DE BARROS, ao opinar pelo conhecimento e provimento do apelo extremo, formulou parecer assim ementado (fls. 298/302): CONSTITUCIONAL. MINISTÉRIO PÚBLICO. ATUAÇÃO EM DEFESA DOS INTERESSES DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. MENOR SOB O PÁTRIO PODER. AÇÃO DE ALIMENTOS. DIREITO INDIVIDUAL INDISPONÍVEL. CF, ARTS. 127 E 129. LEGITIMAÇÃO PROCESSUAL EXTRAORDINÁRIA:POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE DEFENSORIA PÚBLICA ESTRUTURADA. GENITORA ECONOMICAMENTE POBRE. 1. A questão relativa à legitimação processual extraordinária do Ministério Público para promover ação de alimentos em substituição de menor sob o pátrio poder condiz com as normas dos arts. 127 e 129 da CF e representa matéria constitucional de repercussão geral, pois relevante sob o ponto de vista social e jurídico que ultrapassa os interesses subjetivos da causa. 2. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a legitimidade do Ministério Público para tutelar judicialmente interesses individuais indisponíveis de crianças e adolescentes (entre eles o direito a receber alimentos) sempre que atue na defesa dos economicamente pobres e desde que comprovada a atuação precária ou inexistência de assistência jurídica prestada pelas Defensorias Púbicas. Precedentes: RE 248.869, Rel. Min. Maurício Corrêa, RTJ 189/1.156 e RE 147.776, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, RTJ 175/309. 3. Tendo a genitora do menor, pessoa economicamente pobre, buscado a salvaguarda do direito individual indisponível da criança a receber alimentos perante o Ministério Público em face da inexistência de Defensoria Pública na comarca do domicílio do alimentado, deixar de reconhecer legitimidade ativa 'ad causam' ao 'Parquet' conduz à própria negação do direito da criança e implica contrariedade ao princípio da prevalência do interesse do menor. 4. Parecer pelo conhecimento e provimento do recurso. Sendo esse o contexto, passo a apreciar o presente recurso extraordinário. E, ao fazê-lo, entendo assistir plena razão à douta Procuradoria-Geral da República. É que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 248.869/SP, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA (RTJ 189/1156-1157), firmou entendimento que, consubstanciado em acórdão a seguir ementado, confere integral suporte jurídico à postulação recursal ora em análise: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA AJUIZAR AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. FILIAÇÃO. DIREITO INDISPONÍVEL. INEXISTÊNCIA DE DEFENSORIA PÚBLICA NO ESTADO DE SÃO PAULO. 1. A Constituição Federal adota a família como base da sociedade a ela conferindo proteção do Estado. Assegurar à criança o direito à dignidade, ao respeito e à convivência familiar pressupõe reconhecer seu legítimo direito de saber a verdade sobre sua paternidade, decorrência lógica do direito à filiação ( CF, artigos 226, §§ 3o, 4o, 5o e 7o; 227, § 6o). 2. A Carta Federal outorgou ao Ministério Público a incumbência de promover a defesa dos interesses individuais indisponíveis, podendo, para tanto, exercer outras atribuições prescritas em lei, desde que compatível com sua finalidade institucional ( CF, artigos 127 e 129). 3. O direito ao nome insere-se no conceito de dignidade da pessoa humana e traduz a sua identidade, a origem de sua ancestralidade, o reconhecimento da família, razão pela qual o estado de filiação é direito indisponível, em função do bem comum maior a proteger, derivado da própria força impositiva dos preceitos de ordem pública que regulam a matéria ( Estatuto da Criança e do Adolescente, artigo 27). 4. A Lei 8560/92 expressamente assegurou ao 'Parquet', desde que provocado pelo interessado e diante de evidências positivas, a possibilidade de intentar a ação de investigação de paternidade, legitimação essa decorrente da proteção constitucional conferida à família e à criança, bem como da indisponibilidade legalmente atribuída ao reconhecimento do estado de filiação. Dele decorrem direitos da personalidade e de caráter patrimonial que determinam e justificam a necessária atuação do Ministério Público para assegurar a sua efetividade, sempre em defesa da criança, na hipótese de não reconhecimento voluntário da paternidade ou recusa do suposto pai. 5. O direito à intimidade não pode consagrar a irresponsabilidade paterna, de forma a inviabilizar a imposição ao pai biológico dos deveres resultantes de uma conduta volitiva e passível de gerar vínculos familiares. Essa garantia encontra limite no direito da criança e do Estado em ver reconhecida, se for o caso, a paternidade. 6. O princípio da necessária intervenção do advogado não é absoluto ( CF, artigo 133), dado que a Carta Federal faculta a possibilidade excepcional da lei outorgar o 'jus postulandi' a outras pessoas. Ademais, a substituição processual extraordinária do Ministério Público é legítima ( CF, artigo 129; CPC, artigo 81; Lei 8560/92, artigo 2o, § 4o) e socialmente relevante na defesa dos economicamente pobres, especialmente pela precariedade da assistência jurídica prestada pelas defensorias públicas. 7. Caráter personalíssimo do direito assegurado pela iniciativa da mãe em procurar o Ministério Público visando a propositura da ação. Legitimação excepcional que depende de provocação por quem de direito, como ocorreu no caso concreto. Recurso extraordinário conhecido e provido. Cumpre ressaltar, por necessário, que essa diretriz vem sendo observada em sucessivos julgamentos, que, proferidos no âmbito desta Corte, versaram questões idênticas ou assemelhadas à que ora se examina nesta sede recursal ( AI 716.212/RS, Rel. Min.JOAQUIM BARBOSA - RE 222.693/MG, Rel. Min. CEZAR PELUSO - RE 231.704/MG, Rel. Min. CEZAR PELUSO - RE 244.330/MG, Rel. Min. MARCO AURÉLIO - RE 370.035/SP, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA - RE 522.792/SC, Rel. Min. EROS GRAU - RE 541.400/RS, Rel. Min. GILMAR MENDES). O exame da presente causa evidencia que o acórdão ora impugnado diverge dos precedentes estabelecidos por esta Suprema Corte na apreciação da matéria em análise. Sendo assim, e tendo em consideração as razões expostas, conheço do presente recurso extraordinário, para dar-lhe provimento ( CPC, art. 557, § 1º - A), em ordem a reconhecer a legitimidade ativa do Ministério Público para ajuizar ação de alimentos em favor de menor sob a guarda de genitor desprovido de condições financeiras minimamente adequadas, determinando-se, em conseqüência, o regular prosseguimento da demanda perante o órgão judiciário competente de primeira instância. Publique-se. Brasília, 15 de agosto de 2011. No caso presente, o acórdão recorrido diverge dessa pacífica orientação estabelecida por esta Suprema Corte, no sentido de que o Ministério Público possui legitimidade para a propositura de uma ação como a presente, fato a ensejar sua reforma. Ante o exposto, nos termos do artigo 557, § 1º-A, do Código de Processo Civil, conheço do recurso extraordinário e lhe dou provimento para reconhecer a legitimidade ativa do Ministério Público para ajuizar ação de execução de alimentos em favor de menor sob a guarda de genitor desprovido de condições financeiras adequadas, determinando-se, em consequência, o regular prosseguimento do feito na Vara de origem. Publique-se. Brasília, 14 de dezembro de 2011.Ministro Dias Toffoli Relator Documento assinado digitalmente
Referências Legislativas
- CF ANO-1988 ART- 00005 INC-00054 INC-00055 ART- 00102 INC-00003 LET- A ART- 00127 ART- 00129 INC-00009 ART- 00133 ART- 00226 PAR-00003 PAR-00004 PAR-00005 PAR-00007 ART- 00227 PAR-00006 REDAÇÃO DADA PELA EMC-45/2004
- EMC-000045 ANO-2004
- LEI- 005869 ANO-1973 ART- 00081 ART- 00323 PAR-00001 ART-0543A PAR-00003 ART-0543B ART- 00557 PAR-0001A
- LEI- 008069 ANO-1990 ART- 00027
- LEI- 008560 ANO-1992 ART- 00002 ART- 00004
- RGI ANO-1980 ART-00323
- EMR-000021 ANO-2007
Observações
Legislação feita por:(TVS).