25 de Junho de 2022
- 2º Grau
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Supremo Tribunal Federal STF - AGRAVO DE INSTRUMENTO: AI 825520 SP
Publicado por Supremo Tribunal Federal
Detalhes da Jurisprudência
Processo
AI 825520 SP
Partes
TEREZA EDNA PANÍCIO RAIMUNDO, GILSON BENEDITO RAIMUNDO, MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Publicação
DJe-230 DIVULG 29/11/2010 PUBLIC 30/11/2010
Julgamento
18 de Novembro de 2010
Relator
Min. CELSO DE MELLO
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Decisão
O recurso extraordinário a que se refere o presente agravo de instrumento não se mostra processualmente viável, eis que desatendida, no caso, a exigência pertinente ao prequestionamento explícito.Sustenta-se, no recurso extraordinário em questão, que o acórdão recorrido teria ofendido os preceitos inscritos no art. 5º, incisos XXXV e LV, e no art. 93, IX, da Constituição.Sob tal perspectiva, revela-se absolutamente inviável o recurso extraordinário interposto pela parte ora agravante.É que o exame do acórdão recorrido evidencia que, nele, deixaram de ser expressamente analisados os temas de direito constitucional positivo tardiamente suscitados em sede recursal extraordinária.Como se sabe, ausente o indispensável prequestionamento da matéria constitucional, que não se admite implícito (RTJ 125/1368, Rel. Min. MOREIRA ALVES - RTJ 131/1391, Rel. Min. CELSO DE MELLO RTJ 144/300, Rel. Min. MARÇO AURÉLIO - RTJ 153/989, Rel.Min. CELSO DE MELLO), incidem as Súmulas 282 e 356 desta Corte.Não ventilada, no acórdão recorrido, a matéria constitucional suscitada pelo recorrente, deixa de configurar-se, tecnicamente, o prequestionamento do tema, necessário ao conhecimento do recurso extraordinário.A configuração jurídica do prequestionamento - que traduz elemento indispensável ao conhecimento do recurso extraordinário - decorre da oportuna formulação, em momento procedimentalmente adequado, do tema de direito constitucional positivo. Mais do que a satisfação dessa exigência, impõe-se que a matéria questionada tenha sido explicitamente ventilada na decisão recorrida (RTJ 98/754 RTJ 116/451). Sem o cumulativo atendimento desses pressupostos, além de outros igualmente imprescindíveis, não se viabiliza o acesso à via recursal extraordinária, consoante tem proclamado a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RTJ 159/977).De outro lado, com relação à alegada ofensa à norma inscrita no art. 5º, XXXV, da Constituição, torna-se evidente que, no caso ora em exame, foi assegurado, à parte ora agravante, o direito de acesso à jurisdição estatal, não se podendo inferir, do insucesso processual que experimentou, o reconhecimento de que lhe teria sido denegada a concernente prestação jurisdicional.Com efeito, não se negou, à parte recorrente, o direito à prestação jurisdicional do Estado. Este, bem ou mal, apreciou, por intermédio de órgãos judiciários competentes, o litígio que lhe foi submetido.É preciso ter presente que a prestação jurisdicional, ainda que errônea, incompleta ou insatisfatória, não deixa de configurar-se como resposta efetiva do Estado-Juiz à invocação, pela parte interessada, da tutela jurisdicional do Poder Público,circunstância que afasta a alegada ofensa a quanto prescreve o art. 5º, XXXV, da Carta Política, consoante tem enfatizado o magistério jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal (RTJ 132/455, Rel. Min. CELSO DE MELLO RTJ 141/980, Rel. Min. CARLOS VELLOSO AI 120.933-AgR/RS, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA AI 125.492-AgR/SP, Rel. Min. CARLOS MADEIRA).A prestação jurisdicional, que se revela contrária ao interesse de quem a postula, não se identifica, não se equipara, nem se confunde, para efeito de acesso à via recursal extraordinária, com a ausência de prestação jurisdicional.Cumpre ressaltar, a propósito da alegada ofensa ao art. 5º, LV, da Constituição, que a orientação jurisprudencial emanada desta Suprema Corte, firmada na análise desse particular aspecto no qual se fundamenta o recurso extraordinário em causa, tem advertido, considerado o princípio do devido processo legal (neste compreendida a cláusula inerente à plenitude de defesa), que a suposta transgressão ao texto constitucional, caso existente, apresentar-se-ia por via reflexa, eis que a sua constatação reclamaria - para que se configurasse - a formulação de juízo prévio de legalidade, fundado na vulneração e infringência de dispositivos de ordem meramente legal.Daí revelar-se inteiramente ajustável, ao caso ora em exame, o entendimento jurisprudencial desta Corte Suprema, no sentido de que O devido processo legal - CF, art. 5º, LV - exerce-se de conformidade com a lei (AI 192.995-AgR/PE, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - grifei), razão pela qual a alegação de desrespeito à cláusula do devido processo legal, por traduzir transgressão indireta, reflexa, dado que a ofensa direta seria a normas processuais (AI 215.885-AgR/SP, Rel. Min. MOREIRA ALVES AI 414.167/RS, Rel. Min. CEZAR PELUSO RE 257.533-AgR/RS, Rel. Min. CARLOS VELLOSO), não autoriza o acesso à via recursal extraordinária:DUE PROCESS OF LAW E PRINCÍPIO DA LEGALIDADE.- A garantia do devido processo legal exerce-se em conformidade com o que dispõe a lei, de tal modo que eventual desvio do ato decisório configurará, quando muito, situação tipificadora de conflito de mera legalidade, apto a desautorizar a utilização do recurso extraordinário. Precedentes.(RTJ 189/336-337, Rel. Min. CELSO DE MELLO) Alegação de ofensa ao devido processo legal: C.F., art. 5º, LV: se ofensa tivesse havido, seria ela indireta, reflexa, dado que a ofensa direta seria a normas processuais. E a ofensa a preceito constitucional que autoriza a admissão do recurso extraordinário é a ofensa direta, frontal.(AI 427.186-AgR/DF, Rel. Min. CARLOS VELLOSO)Inviável o processamento do extraordinário para debater matéria infraconstitucional, sob o argumento de violação ao disposto nos incisos LIV e LV do artigo 5º da Constituição.Agravo regimental improvido.(AI 447.774-AgR/CE, Rel. Min. ELLEN GRACIE - grifei) Nem se alegue, neste ponto, que a suposta transgressão ao ordenamento legal - derivada da interpretação que lhe deu o órgão judiciário a quo - teria importado em desrespeito ao princípio constitucional da legalidade.Não se pode desconsiderar, quanto a tal postulado, a orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal, cuja jurisprudência vem proclamando, a propósito desse tema, que o procedimento hermenêutico do Tribunal inferior - quando examina o quadro normativo positivado pelo Estado e dele extrai a interpretação dos diversos diplomas legais que o compõem, para, em razão da inteligência e do sentido exegético que lhes der, obter os elementos necessários à exata composição da lide - não transgride, diretamente,o princípio da legalidade (AI 161.396-AgR/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO AI 192.995-AgR/PE, Rel. Min. CARLOS VELLOSO AI 307.711/PA, Rel. Min. CELSO DE MELLO).É por essa razão - ausência de conflito imediato com o texto da Constituição - que a jurisprudência desta Corte vem enfatizando que A boa ou má interpretação de norma infraconstitucional não enseja o recurso extraordinário, sob color de ofensa ao princípio da legalidade ( CF, art. 5º, II) (RTJ 144/962, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - grifei):E é pacífica a jurisprudência do S.T.F., no sentido de não admitir, em R.E., alegação de ofensa indireta à Constituição Federal, por má interpretação de normas infraconstitucionais, como as trabalhistas e processuais (...).(AI 153.310-AgR/RS, Rel. Min. SYDNEY SANCHES - grifei)A alegação de ofensa ao princípio da legalidade, inscrito no art. 5º, II, da Constituição da República, não autoriza, só por si, o acesso à via recursal extraordinária, pelo fato de tal alegação tornar indispensável, para efeito de sua constatação, o exame prévio do ordenamento positivo de caráter infraconstitucional, dando ensejo, em tal situação, à possibilidade de reconhecimento de hipótese de mera transgressão indireta ao texto da Carta Política. Precedentes.(RTJ 189/336-337, Rel. Min. CELSO DE MELLO) Não foi por outro motivo que o eminente Ministro MOREIRA ALVES, Relator, ao apreciar o tema pertinente ao postulado da legalidade, em conexão com o emprego do recurso extraordinário, assim se pronunciou:A alegação de ofensa ao artigo 5º, II, da Constituição, por implicar o exame prévio da legislação infraconstitucional, é alegação de infringência indireta ou reflexa à Carta Magna, não dando margem, assim, ao cabimento do recurso extraordinário.( AI 339.607/MG, Rel. Min. MOREIRA ALVES - grifei) Cumpre acentuar, neste ponto, que essa orientação acha-se presentemente sumulada por esta Corte, como resulta claro da Súmula 636 do Supremo Tribunal Federal, cuja formulação possui o seguinte conteúdo:Não cabe recurso extraordinário por contrariedade ao princípio constitucional da legalidade, quando a sua verificação pressuponha rever a interpretação dada a normas infraconstitucionais pela decisão recorrida. (grifei) Impende registrar, no que se refere à alegada transgressão ao postulado constitucional que impõe, ao Poder Judiciário, o dever de motivar suas decisões (CF, art. 93, IX), que o acórdão emanado do Tribunal a quo, ao contrário do que sustenta a parte ora agravante, encontra-se extensamente fundamentado, satisfazendo-se, desse modo, por inteiro, a exigência de motivação imposta por aquele preceito da Constituição da República.É preciso ter presente, ainda no tocante à alegada ausência de motivação da decisão recorrida, que a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal (RTJ 170/627-628, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.) orienta-se no sentido de que O que a Constituição exige, no art. 93, IX, é que a decisão judicial seja fundamentada. Não, que a fundamentação seja correta, na solução das questões de fato ou de direito da lide: declinadas no julgado as premissas, corretamente assentadas ou não, mas coerentes com o dispositivo do acórdão, está satisfeita a exigência constitucional (RTJ 150/269, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - grifei).Em conclusão: qualquer que seja o ângulo sob o qual se examine a pretensão recursal deduzida pela parte ora agravante, o fato é que essa postulação encontra obstáculo de ordem técnica na jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal, consoante resulta claro de decisão, que, emanada desta Corte, reflete, com absoluta fidelidade, o entendimento jurisprudencial prevalecente no âmbito do Tribunal:Inviável o processamento do extraordinário para debater matéria infraconstitucional, sob o argumento de violação ao disposto nos artigos 5º, II, XXXV, XXXVI, LIV e LV e 93, IX da Constituição.Agravo regimental improvido.(AI 437.201-AgR/SP, Rel. Min. ELLEN GRACIE - grifei) Cabe destacar, finalmente, que não se revela cabível proceder, em sede recursal extraordinária, a indagações de caráter eminentemente probatório, especialmente quando se busca discutir elementos fáticos subjacentes à causa penal.No caso, a verificação da procedência, ou não, das alegações deduzidas pela parte recorrente implicará necessário reexame de fatos e de provas, o que não se admite na sede excepcional do apelo extremo.Essa pretensão sofre as restrições inerentes ao recurso extraordinário, em cujo âmbito não se reexaminam fatos e provas, circunstância essa que faz incidir, na espécie, a Súmula 279 do Supremo Tribunal Federal.Não custa enfatizar, consoante adverte o magistério da doutrina (ADA PELLEGRINI GRINOVER, ANTONIO MAGALHÃES GOMES FILHO e ANTONIO SCARANCE FERNANDES, Recursos no Processo Penal, p. 269/270, item n. 176, 1996, RT), que o reexame dos fatos e das provas constitui tema estranho ao âmbito de atuação do recurso extraordinário (Súmula 279/STF), ainda que se cuide, como no caso, de matéria de índole penal.Sendo assim, e pelas razões expostas, nego provimento ao presente agravo de instrumento, eis que se revela inviável o recurso extraordinário a que ele se refere.Publique-se.Brasília, 18 de novembro de 2010.Ministro CELSO DE MELLO Relator